Alto endividamento limita negócios com usinas
29-05-2015

A crise financeira que ameaça a economia brasileira não traz apenas incertezas ao setor sucroalcooleiro. Na busca por rentabilidade e pouco risco, os bancos interessados em ofertar crédito às empresas buscam concentrar seus empréstimos naquelas que eles acreditam ser imunes à crise.

Por conta de facilidades logísticas e pelo perfil robusto dos sócios, a Raízen conseguiu recentemente concluir uma captação no exterior no montante de cerca de US$ 750 milhões. E em condições melhores do que as obtidas no ano passado, quando a empresa também captou no mercado internacional. A empresa não concedeu entrevista para o Valor por estar em período de silêncio.

"Os bancos precisam alocar capital. Como têm mais aversão aos ativos que não possuem o grau de investimento, todos os bancos querem ir para o melhor perfil de risco. Quem tem grau de investimento se beneficia. É o caso da Raízen. Mesmo quem não tem, mas tem pouca alavancagem se beneficia", explica Ernesto Meyer, responsável pela área de empréstimos sindicalizados do BNP Paribas, um dos bancos líderes da captação feita pela Raízen.

De acordo com o executivo, o mercado vive a chamada busca pela qualidade. Em meio a tantas incertezas na economia e consequentemente no mundo das empresas, os bancos estão em busca de empresas com baixo risco para alocar recursos.

"O mercado segue líquido. Existem recursos no exterior disponíveis para as empresas brasileiras, mas os bancos estão mais seletivos do que no passado", diz Meyer, do BNP.

José Stamato, responsável pela área de agronegócio do Banco de Tokyo, também líder do acordo firmado pela Raízen, diz que o momento é delicado para o setor de açúcar e álcool por conta da queda do preço em dólares do açúcar no mercado internacional.

Mesmo assim, ele diz que o setor ainda é atraente para os bancos. Só o Banco de Tokyo ampliou em cinco vezes o portfólio do segmento do agronegócio desde 2011.

"Os bancos europeus seguem com apetite para o Brasil. Claro que as maiores do setor se beneficiam, mas ainda assim as menores seguem com o canal aberto. Mesmo com a crise nós conseguimos crescer no setor", diz.

Stamato afirma que o setor sucroalcooleiro é um dos mais importantes para o banco. Mesmo com preços mais baixos, ele acredita que o setor continuará crescendo nos próximos anos e que seu banco irá apoiar o segmento com o capital de giro necessário para isso.

"Nós estamos olhando o Brasil pensando no longo prazo. Então mesmo com um ou dois anos com problemas, o cenário de longo prazo é promissor. Nós estamos tentando diversificar o portfólio, especialmente para empresas não-japonesas", explica.

Não somente a Raízen conseguiu captar no mercado externo. O Grupo Virgolino de Oliveira concluiu uma captação lastreada em reais para refinanciar parte de sua dívida em 2014. A demanda por essa operação concluída no ano passado superou a oferta em duas vezes.

A Tonon Bioenergia obteve resultados semelhantes em 2014 ao usar o expediente de oferecer ativos em reais como garantia. A empresa se valeu de uma usina adquirida para esse fim.

No caso do BNP Paribas, o interesse no setor se concentra nas maiores empresas. Meyer, diretor da área no banco, cita que a Raízen, por ser a maior do setor e possuir uma estrutura societária sólida desfruta de condições melhores do que as demais ao contrair dívidas.

Apesar de essas empresas terem obtido empréstimos no ano passado, não significa que elas estejam livres de problemas. O alto endividamento do setor dificulta a capacidade de pagamento das empresas. Algumas se viram obrigadas a trocar o pagamento de dívidas por participações na sociedade. A GVO se encontra em meio a um longo processo de renegociação dessas dívidas.

Nem mesmo o câmbio desvalorizado é capaz de mudar a visão dos bancos sobre o setor. Por mais que a moeda brasileira tenha se desvalorizado em relação ao dólar, a cotação do açúcar em reais segue com tendência de baixa, o que deixa o cenário ainda turvo, diz o executivo do Banco de Tokyo.

"O ritmo de queda dos preços caiu. Isso aponta para um piso dos preços do açúcar, mas ainda assim não é suficiente para dizer que não vai cair mais", afirma Meyer do BNP.

.As chuvas em áreas produtoras do Centro-Sul do Brasil e as medidas de apoio do governo ao setor sucroenergético tendem a beneficiar mais a Raízen Energia neste ano do que suas concorrentes, avalia a Moody´s em relatório divulgado nesta quarta-feira (27).

De acordo a agência de classificação de risco, a empresa, uma joint venture entre Shell e Cosan, investiu mais em plantio e tratamento dos canaviais durante a safra 2014/15, encerrada em março. "A Raízen ganhará com uma produção maior de cana e também melhor produtividade em 2015/16", destaca o relatório. Até o terceiro trimestre do ciclo 2014/15, terminado em dezembro, a Raízen havia desembolsado R$ 687,5 milhões em renovação e tratamento de plantações, diz a Moody´s.

Com isso, a agência projeta um incremento de 5% no volume de cana processado pelas unidades produtoras da companhia na temporada 2015/16, que vai até março do ano que vem.