Com irrigação por gotejo, Usina Japungu e Usina Bevap registram produtividade superior a 100 tch em canaviais acima de dez cortes
28-10-2021

Comparativo entre área irrigada por gotejamento X área de sequeiro demonstra potencial da tecnologia. Foto: Divulgação Netafim
Comparativo entre área irrigada por gotejamento X área de sequeiro demonstra potencial da tecnologia. Foto: Divulgação Netafim

Tecnologia possibilita aumento da longevidade das áreas; redução de custos operacionais e de produção; ampliação da cogeração de energia e melhor pontuação no Renovabio, grande economia de água e energia e menor dependência do clima

Por Leonardo Ruiz

Desde o início do monitoramento das bacias hidrográficas no Brasil há 91 anos, o país não registrava uma crise hídrica tão severa. Essa estiagem – cuja pior faceta foi observada sobre os estados que compõe o Centro-Sul – atingiu praticamente toda a cadeia produtiva do agronegócio. Produtores das mais diversas culturas amargaram prejuízos bilionários em função de drástica quebra na produção.

Na cana-de-açúcar, não foi diferente. A expectativa é que a safra 2021/22 seja de 20% a 30% menor do que o registrado no ciclo passado, quando as usinas do Centro-Sul processaram 605,46 milhões de toneladas de cana-de-açúcar. A falta de matéria-prima, inclusive, tem antecipado o início da entressafra em diversas unidades. Em anos agrícolas considerados bons, a moagem se estende até meados de dezembro. Em 2021, no entanto, a maioria das empresas deve paralisar suas operações em outubro.

Diante da crise hídrica deste ano, a irrigação está no radar de diversas usinas e produtores do Centro-Sul e deve ser o foco do setor para os próximos anos

Foto: Banco de dados Internet

A crise hídrica de 2021 vem sendo “anunciada” desde o final do ano passado. Mas, se olharmos com cuidado, veremos que de 2019 para cá todos os anos registraram um regime de chuvas abaixo do normal. Esse quadro coloca a irrigação tecnificada na planilha de investimentos no curto e médio prazo de muitas unidades sucroenergéticas e produtores da região Centro-Sul, que passam a considerar essa prática como a principal aliada na neutralização de tantos efeitos negativos. Aqueles que investiram na solução em anos anteriores conseguiram passar quase “ilesos" pela estiagem de 2021.

Dentre as diferentes modalidades de irrigação, a por gotejamento é, de longe, a mais eficiente e a que traz os melhores resultados

Foto: Divulgação Netafim

Irrigação por gotejo valoriza o uso da água e potencializa os benefícios da irrigação

O uso de irrigação em canaviais é uma prática comum na região Nordeste do Brasil, mas no Centro-Sul ainda é pontual, porque até pouco tempo, muitos não viam como necessidade, também devido à dificuldade da autorização de outorgas para o uso da água e o alto custo desse bem natural.

Uma das modalidades mais comuns de irrigação é por aspersão. O método é bastante simples: através de um emissor e com a pressão certa, a água é projetada pelo ar, se dissipando em gotículas pelo espaço, e caindo por cima das plantações, assim como a chuva.

No entanto, ao serem projetadas no ar, essas gotículas podem acabar facilmente sendo arrastadas pelo vento – irrigando a área do vizinho - ou evaporadas antes de alcançarem a lavoura. Grande porcentagem dessa água pode ainda ficar retida sobre as folhas, não chegando ao alvo principal: as raízes. Por conta disso, a eficiência dessa modalidade gira entre 80% e 85%.

Irrigação por gotejamento alcança eficiência de 95% a 100% em função de seus tubos estarem enterrados e com fácil acesso às raízes durante todo o período de desenvolvimento da cana

Foto: Divulgação Netafim

Essas inconveniências da irrigação tradicional é outro ponto que pesa negativamente para a adoção em maior escala dessa prática, principalmente nas lavouras paulistas, onde a política do uso da água na agricultura é bastante restrita.

Mas é aí que entra o avanço tecnológico na área de irrigação, o gotejamento. Um meio mais sustentável do uso da água na agricultura. Daniel Pedroso, especialista Agronômico da Netafim, empresa pioneira e líder mundial em soluções para irrigação, salienta que a eficiência da irrigação por gotejamento vai de 95% a 100%. Além disso, esse sistema entrega as quantidades ideais de recursos hídricos de acordo com as fases do seu cultivo, no momento certo e diretamente na raiz da planta, maximizando o rendimento e a economia.

O profissional observa que o gotejo permite irrigar a cana-de-açúcar sempre que necessário, ao contrário da irrigação por aspersão, uma vez que é impossível entrar com sua estrutura no meio de canaviais mais velhos. “Se uma área de 10 meses enfrentar um período de elevada deficiência hídrica, apenas a irrigação por gotejamento conseguirá ‘salvar’ a cana.”

Outro diferencial da tecnologia é a possibilidade de aplicação de moléculas químicas e orgânicas e produtos biológicos através dos mesmos equipamentos de injeção de água. “O ‘Drip Protection’ foi desenvolvido pela Netafim e permite ao agricultor aprimorar sua adubação convencional, aplicando parte dos nutrientes de forma mais parcelada seguindo uma agenda previamente determinada visando suprir a necessidade da planta para seu pleno desenvolvimento e produção. Além de uma cana mais vigorosa, essa prática também reduz custos de aplicação, evita a alta salinidade causada pelo uso excessivo de fertilizantes e impede a lixiviação e, consequentemente, a perda dos produtos aplicados.”

Além de água, é possível aplicar moléculas químicas e orgânicas e produtos biológicos através do sistema de irrigação por gotejamento

Foto: Divulgação Netafim

A experiência da Netafim em irrigação é fruto da vivência com a escassez hídrica em seu país de origem, Israel, onde os avanços em irrigação transformaram desertos em lavouras altamente produtivas. E essa possibilita que a empresa entrega à lavoura canavieira. Atualmente, a Netafim oferece duas modalidades tecnológicas de gotejo para cana-de-açúcar. Em canaviais comerciais, é recomendada a irrigação por gotejamento subterrânea. Já em viveiros (Cantosi ou Meiosi), é possível instalar as mangueiras e tubos gotejadores de forma superficial e movê-los para novas áreas sempre que necessário. As soluções podem ser instaladas de pequenos a grandes canaviais. “Temos exemplos de viveiros de apenas cinco hectares até lavouras comerciais de 10 mil hectares. A eficiência será sempre a mesma”, ressalta Pedroso.

Benefícios da irrigação por gotejamento vão muito além do aumento de produtividade

De todos os fatores que afetam a produção de cana-de-açúcar, a irrigação por gotejamento é a que mais aumenta a produtividade. Novas variedades conseguem elevar a produção de uma área em 14%. A fertilidade do solo, em 13%. Já a solução da Netafim tem o potencial de incrementar a produtividade da cultura em até 50% em anos “normais” e de 70% a 80% em anos de alto déficit hídrico.

No entanto, Pedroso, reforça que os benefícios da irrigação por gotejamento da Netafim vão além do simples aumento de produtividade, passando também pela maior longevidade dos canaviais. “Quando irrigamos por gotejamento, paramos de falar de cana de cinco ou seis anos e começamos a pensar em canas acima de 12 anos. Lembrando que são áreas longevas, mas de alta produtividade. Temos canaviais em São Paulo indo para o oitavo corte com uma produtividade média de 130 Toneladas de Cana por Hectare (TCH).”

Daniel Pedroso: “A irrigação por gotejamento tem o potencial de incrementar a produtividade da cana-de-açúcar em até 50% em anos “normais” e de 70% a 80% em anos de alto déficit hídrico”

Foto: Divulgação Netafim

Outro benefício constatado é a redução considerável dos custos com o CTT (corte, transbordo e transporte), uma das operações mais onerosas do sistema de produção de cana-de-açúcar. De acordo com Pedroso, com o aumento de produtividade provocado pelo gotejamento, há uma grande redução no custo do corte. Esse fato ocorre porque uma única colhedora leva menos tempo para encher um transbordo, devido ao elevado número de toneladas por metro de cana-de-açúcar. 

 Redução considerável dos custos com o CTT é outra vantagem do sistema de irrigação por gotejamento

Foto: Leonardo Ruiz

Os gastos com óleo diesel por tonelada colhida por metro percorrido, horas de máquinas de trabalho por tonelada colhida e tempo do operador também são muito menores. “Vale ressaltar que o custo com o transbordo também será reduzido, pois quanto maior a produtividade menor será a quantidade de óleo diesel gasto por tonelada de cana por km percorrido”, diz o especialista

Todos esses benefícios - incremento de produtividade; aumento da longevidade do canavial; redução de custos operacionais e de produção; ampliação da cogeração de energia; melhor pontuação no Renovabio; grande economia de água e energia e menor dependência do clima - compensam o custo inicial um pouco mais elevado do sistema do gotejo em comparação com outras modalidades de irrigação. Pedroso ressalta que o gotejo se paga facilmente em 3,5 anos tomando como base os preços históricos de açúcar e etanol. No entanto, com patamares atuais, esse retorno ocorrerá em apenas 1,5 ano.

Áreas irrigadas por gotejamento na Usina Japungu entregam quase o triplo de produtividade em comparação com o restante dos canaviais

Localizada no município paraibano de Santa Rita, a Japungu Agroindustrial tornou-se um exemplo do uso na irrigação para uma boa produção de cana-de-açúcar ao longo da safra. Com 26 mil hectares de área própria, a usina possui uma equipe dedicada com mais de 600 pessoas e uma robusta estrutura de irrigação em diferentes métodos. No entanto, são nos 5500 hectares de área irrigada por gotejamento subterrâneo que a empresa alcança suas melhores produtividades.

Média de produtividade dos canaviais irrigados via sistema de gotejo na Japungu atingiu 112 TCH na última safra

Foto: Divulgação Netafim

O diretor da companhia, José Bolivar de Melo Neto, afirma que a média de produtividade dos canaviais irrigados via sistema de gotejo atingiu 112 TCH na última safra. Em uma comparação bruta, a média geral de todas as áreas da usina é 57 TCH. “Na minha visão, o principal benefício da irrigação por gotejamento é a possibilidade de alta produtividade no terço final do ciclo, quando registramos um déficit hídrico bem mais acentuado. Nesse período, inclusive, nossa produtividade média geral cai para apenas 43 TCH.”

Além de ganhos na produção, a empresa paraibana tem observado maior longevidade dos canaviais irrigados por gotejo. Alguns, inclusive, estão caminhando para o 13º corte com uma produtividade média de 106 TCH. “Acredito que será possível levar essas áreas por mais três ou quatro anos, ganhando assim duas renovações e reduzindo os custos com implantação de um novo canavial.”

José Bolivar de Melo Neto: “O gotejo é o suprassumo da tecnologia de irrigação”

Foto: Banco de dados Internet

Outro ponto positivo destacado por Bolivar foi em relação a melhoria da eficiência dos fertilizantes e defensivos. “Os tubos gotejadores estão enterrados próximos às raízes e funcionam como uma injeção diretamente na veia. Dessa forma, qualquer tecnologia aplicada terá melhor desempenho. É possível também aplicar os insumos de forma mais parcelada e proporcional de acordo com a fase fenológica e demanda nutricional do cultivo.”

O Diretor da Japungu afirma que mais 500 hectares receberão a tecnologia da Netafim em breve, totalizando 6 mil hectares cobertos. O objetivo da companhia é expandir essa área para 8 mil hectares num futuro próximo. “O gotejo é o suprassumo da tecnologia de irrigação. Com ele, provamos que é possível equiparar nossa produtividade à da região Centro-Sul.”

Irrigação por gotejamento eleva produtividade de áreas de sequeiro da Bevap de 70 TCH para 180 TCH

Localizada em João Pinheiro/MG, a Bevap possui uma das maiores áreas irrigadas de cana-de-açúcar do mundo. São cerca de 30 mil hectares cobertos, totalizando praticamente 100% de seus canaviais. Entre as modalidades adotadas, destacam-se o salvamento com hidro roll, pivôs de diversos modelos e o gotejamento subterrâneo.

Bevap, de João Pinheiro/MG, possui uma das maiores áreas irrigadas de cana-de-açúcar do mundo

Foto: Divulgação Netafim

O diretor agrícola da empresa, Hermes Augusto Guimarães Arantes, afirma que, de todas as tecnologias de irrigação, a de maior retorno é o gotejo. Áreas anteriormente de sequeiro saíram de 70 TCH para mais de 180 TCH. “Além de possibilitar um amplo crescimento vertical, essa modalidade nos permitiu otimizar o uso da água, uma vez que 100% do recurso hídrico é aproveitado nesse sistema. Começamos a implantação em 2017 com projetos pequenos, de 80 a 100 hectares cada. Hoje, já estamos no décimo projeto, que inclui áreas maiores, de 200 a 250 hectares.”

Atualmente, a irrigação por gotejamento cobre 1525 hectares de canaviais da Bevap. Mas Arantes afirma que a empresa pretende, em breve, expandir essa área para 6 mil hectares. “O custo com irrigação aumentou durante a pandemia. Mas a relação custo x benefício ainda segue bastante positiva, principalmente quando o sistema adotado é o gotejo.”

Hermes Augusto Guimarães Arantes: “Além de possibilitar um amplo crescimento vertical, a irrigação por gotejamento nos permitiu otimizar o uso da água, uma vez que 100% do recurso hídrico é aproveitado”

Foto: Divulgação Netafim

Diante da seca deste ano, o retorno financeiro ficou ainda mais evidente. O diretor agrícola da Bevap ressaltou que as poucas áreas de sequeiro ou de salvamento com hidro roll sofreram severas perdas de produtividade em função da estiagem. O mesmo não aconteceu com as áreas irrigadas via sistema de gotejo. “Somando todos nossos canaviais, tivemos uma quebra na produção de apenas 5%, enquanto outras unidades amargaram prejuízos na ordem de 15% a 30%.”

Segundo Arantes, após 2021, as usinas do Centro-Sul passarão a olhar de forma diferente para a irrigação. “Praticamente todas as semanas recebemos visitas de outras empresas querendo conhecer nossas práticas e tecnologias. É uma realidade que vinha sendo discutida há algum tempo, mas que, com a estiagem deste ano, deve se tornar uma tendência, especialmente em canas de final de safra, as que mais sofrem com a falta de chuvas.”

Fonte: CanaOnline