Companhias aceleram as emissões de títulos verdes
06-06-2022

Apesar de atrasadas em relação aos países europeus, as empresas brasileiras têm acelerado o uso de instrumentos do mercado de capitais para emitirem títulos sustentáveis. A pandemia impulsionou a corrida para entrar em conformidade com a Agenda 2030, das Nações Unidas (ONU) e levou as companhias a quase triplicarem emissões temáticas no mercado doméstico e internacional em 2021 atingindo R$ 85,69 bilhões - mais da metade dos R$ 155 bilhões registrados de 2015 até 2 de maio deste ano, segundo levantamento da Natural Intelligence (Nint, spin off da Sitawi Finanças do Bem).

Para acessar o mercado externo, as empresas têm usado mecanismos temáticos como green bonds, social bonds, sustainable bonds, transation bonds e sustainability linked bonds (SLB), em que encontram uma demanda maior e mais acostumada com esses títulos. No Brasil, quem faz às vezes são as debêntures incentivadas e os Certificados de Recebíveis do Agronegócio (CRAs), cujo público mais forte está ligado a investidores institucionais e às family offices detentoras de grandes fortunas. Só este ano, foram R$ 16,22 bilhões em emissões desta categoria.

Além do tema, a diferença entre os títulos emitidos no mercado internacional está relacionada aos compromissos assumidos e aos prêmios pagos pelas empresas ao investidor. Com exceção do SLB, as outras emissões têm os recursos carimbados em projetos ambientais (green), sociais (social), sustentáveis (sustainable) e de energia renovável (transation) e, com frequência, atingem taxas que o mercado chama de prêmio verde. "Isso no mercado internacional. Já no local, a taxa nem sempre é atrativa. Então as empresas fazem como forma de alinhar o discurso ESG ao projeto de dívida. Ajuda no aspecto reputacional", diz Gustavo Pimentel, sócio-fundador e CEO da Nint, consultoria de avaliação ESG.

O executivo diz que o SLB é a única modalidade entre os títulos temáticos cuja captação é baseada em metas ESG e que não precisa destinar os recursos a projetos específicos. "Essas emissões deram uma arrancada de 2021 para cá e o comprometimento com as metas ESG significa, muitas vezes, um corte na taxa de juros. As empresas têm nesses instrumentos incentivos econômicos, além do reputacional."

Assim como no exterior, o amadurecimento dessas operações no mercado de capitais doméstico trouxe novos agentes. Geralmente estruturadas nos bancos de investimentos privados, no início de maio, o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) concluiu sua primeira coordenação de oferta pública de emissão de debêntures verdes. A operação, feita em nome da RDVE Subholding, empresa do grupo Casa dos Ventos, no valor de R$ 430 milhões, é para financiar a conclusão de quatro dos oito parques eólicos da empresa. "No Brasil, a temática vem se desenvolvendo nos últimos cinco anos e ganhou força e relevância por causa da pandemia. O BNDES, em 2017, fez uma emissão de green bonds de US$ 1 bilhão, com duração de 7 anos", diz Lourenço Tigre, diretor financeiro do BNDES.

O banco também tem uma linha de crédito específica para programas verdes como o RenovaBio, com redução de custo na medida em que o tomador melhora a eficiência energética em suas usinas.

Os especialistas ressaltam que as emissões de crédito temáticas são um posicionamento público da empresa perante os stakeholders, no qual ela se compromete a adotar determinados valores em relação à sociedade. "Mas claro que também tem as condições financeiras, pois elas pagam menos juros com este tipo de instrumento, pois os investidores estão dispostos a receber menos retorno porque estão fazendo bem à sociedade", observa Silvio Marote, sócio da área de serviços financeiros da Bain & Company. O consultor estima que a cada US$ 100 milhões emitidos, a empresa reduz o prêmio de 5% para 4% ao ano.

Já a Neo, que possui dois fundos ESG, prefere as emissões de ações das empresas e exclui de seu portfólio petroleiras, mineradoras e frigoríficos. A gestora faz a revisão dos relatórios de sustentabilidade das companhias investidas. "Nosso mandato não restringe temas específicos, mas integra o ESG na análise. Os filtros são análises criteriosas em aspectos que envolvem o ESG, se o modelo de negócio tem ESG", observa Andrea Böttcher, líder de ESG na Neo Investimentos.

Fonte: Valor Econômico
Texto extraído do boletim SCA