E ainda precisamos perguntar o que fazer
13-06-2014

Não chegam a ser animadoras as notícias da reunião em Bonn, com representantes de 170 países tentando esboçar um acordo global sobre emissões de poluentes que chegue a um texto final em dezembro, na reunião da Convenção do Clima em Lima, no Peru. E que possa ter aprovação definitiva em 2015, em Paris, para vigorar a partir de 2020. Os Estados Unidos, a Europa, até a China dizem-se dispostos a um acordo. Mas tudo ainda continua distante. E parece temerária tanta dilação, quando estudos de dezenas de milhares de cientistas apontam a necessidade de chegar imediatamente a cortes radicais nas emissões.

Diz a União Europeia que ultrapassará em 2020 suas metas de redução - tanto que em 2012 conseguiu reduzi-las em 19%, confrontadas com as de 1990 - e em 2030 chegará a 30%. Já os EUA em 2012 reduziram em 4,3% as emissões e o corte iria a 30%, enquanto a China triplicou as suas em relação a 1990.

Christiana Figueres, secretária-geral da convenção, tem dito que será difícil chegar a uma redução que, até 2050, permita conter em, no máximo, 2 graus Celsius o aumento da temperatura planetária (o Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas prevê um aumento da temperatura entre 1,5 e 4,5 graus até o fim do século). Além do corte no uso do petróleo, do gás e do carvão, será indispensável, diz ela, investir em novas tecnologia. Alguns setores já investem em tecnologias para capturar emissões nas fontes e sepultá-las no fundo da terra ou do mar (mas há advertências quanto aos efeitos negativos).

Até produtores de energias a partir de fontes fósseis começam a investir em renováveis - embora os investimentos gerais na área tenham caído (New Scientist, 15/3) e o mundo continue a perguntar: como estocar energia eólica, ou solar? Segundo a Agência Internacional de Energia (4/6), será preciso investir mais de US$ 48 trilhões em 21 anos para atender à demanda, e que não polua. Os investimentos hoje estão em US$ 1,6 bilhão por ano, US$ 550 milhões abaixo dos mais de US$ 2 bilhões indispensáveis.

E surgem novas questões. Como, por exemplo, a de que a Alemanha, a maior investidora em energias renováveis (já tem 23% do total consumido no país hoje), está recuando de suas posições - entre elas, a renúncia ao uso do carvão e da energia nuclear, a tal ponto que em 2013 suas emissões voltaram a subir, ao mesmo tempo que os investimentos em renováveis baixaram 56%.

Capítulo à parte é o da China, que, no cenário mais otimista, emitirá 6,5 bilhões de toneladas de poluentes no ano que vem e somente a partir de 2100 chegará a US$ 1,8 bilhão/ano. Mas os índices de emissão por pessoa já são menores que os dos EUA (só que com uma população algumas vezes maior). E o país ainda imporá multas aos chineses que aumentarem suas emissões, a partir de 2016.

José V. Marengo, do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais, tem dito que os efeitos das mudanças na América do Sul já são preocupantes nas áreas de recursos hídricos, produção de alimentos e saúde. "Não dá para esperar mais pelas providências", diz ele. E é coadjuvado pelo cientista Paulo Artaxo, professor da USP, alertando que os efeitos do clima atingirão muito mais as camadas mais pobres da população; as alterações já são muito claras no Nordeste brasileiro.

Desastres recentes, como os da Bósnia, da Sérvia (os mais fortes em cem anos), do Chile, mostram os rumos da questão. A ponto de corporações militares já advertirem (The New York Times, 13/5) que estão claramente presentes "riscos para a segurança nacional", que podem conduzir a confrontos globais, especialmente em função do Oriente Médio e da África, além de países como Índia, Bangladesh, os do Delta do Mekong e outros - seja por causa de elevações do nível dos oceanos, seja pela questão dos refugiados. "A questão terá influências na política externa dos Estados Unidos", tem sentenciado o secretário de Estado, John Kerry. Questões do clima já se estão evidenciando nos últimos planos anunciados pelo presidente Barack Obama. O último Relatório de Avaliação Nacional do Clima nos Estados Unidos chama a atenção para a elevação de até 20 centímetros no nível dos mares em um século e meio. E que continuará acontecendo - entre 30 centímetros e 1,2 metro - até 2100. Pode-se relembrar também as últimas notícias sobre as geleiras do Ártico, assim como as da Agência de Meteorologia Mundial, ao informar que pela primeira vez o nível de concentração de dióxido de carbono está ultrapassando 400 partes por milhão, ou 40% mais que nos níveis pré-industriais.

É preciso implementar com muita urgência processos de adaptação às mudanças em todos os lugares, advertem instituições científicas. Muitos países (New Scientist, 5/4) não sabem o que acontecerá com eles, nem o que precisam fazer - até porque os caminhos serão específicos para cada lugar, desde a implantação de variedades agrícolas mais resistentes à retirada maciça de habitantes de áreas de risco.

O Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (Pnuma), por sua vez, tem conclamado por novos indicadores de desenvolvimento que não se atenham apenas a fatores econômicos, mas incluam o clima, o combate à pobreza, os avanços na saúde. E prossegue muito forte a tendência de grandes investidores globais de aplicar em projetos rentáveis na área das energias sustentáveis, embora sejam contrários ao fim dos subsídios para o uso de petróleo, gás e carvão. É "the booming business of global warming", diz a mesma New Scientist (29/4). Como sempre, o confronto entre a lógica da prudência e as lógicas financeiras.

Por aqui, o Itamaraty está lançando uma consulta nacional para saber que acordos internacionais na área do clima a população deseja - 22 anos depois da Rio-92; e no momento em que dezenas de cidades paranaenses estão debaixo do dilúvio de chuvas que, em poucos dias, ultrapassaram o que era esperado para três meses.

Washington Novaes - Jornalista