Esqueçam as teorias econômicas
01-04-2019

Destruam os livros de economia. Esqueçam o que escreveram Adam Smith ou Enrico Barone. O setor sucroalcooleiro criou sua própria teoria econômica. Nela, quando falta produto, os preços caem. E quando o estoque do produto é alto (como ocorreu com o etanol em outubro do ano passado), os preços atingem seu pico. A afirmação não é minha, mas de um experiente trader do mercado, em desabafo. Hoje vemos os preços do etanol caírem em plena entressafra, apesar da perspectiva de melhor consumo e a quase certeza de que o Centro-Sul vai moer menos cana do que o mercado tem antecipado.

O estreitamento do spread maio/julho é uma indicação de que os participantes do mercado futuro negociado em NY começam a se preocupar com a disponibilidade de açúcar nesse início de moagem. O spread fechou a semana negociando a 10 pontos. Usinas que estavam com fixações de preço pendentes para os açúcares negociados no mercado físico com vencimento contra o contrato de maio, decidiram corretamente rolaras fixações para o vencimento julho, assim ganhando 60 dias adicionais na esperança de conseguirem melhores preços. Uma decisão acertada, no nosso entendimento, a um custo próximo dos 5% ao ano.

É evidente que a decisão implica em alguns riscos. Por exemplo, o ambiente político no Brasil é bem pior do que se podia imaginar. Antes da posse do presidente Jair Bolsonaro, as empresas apostavam que o real iria se valorizar fortemente frente à moeda americana e que a aprovação das reformas necessárias para colocar o país de volta aos trilhos ocorreria ainda no primeiro semestre. Os mercados desanimaram com a falta de traquejo político do presidente e o dólar beliscou os R$ 4,0000. Com isso açúcar em NY, pressionado pelo melhor preço de liquidação em reais por tonelada, negociou dentro de um restrito intervalo de preços. Esse quadro limitou qualquer recuperação de preços do açúcar, apesar da melhora dos preços do petróleo no mercado internacional.

Existem várias razões para se crer em uma recuperação dos preços do açúcar em NY. Acreditamos que a moagem no Centro-Sul deve ficar entre 560-570 milhões de toneladas de cana. Difícil falar em expansão do canavial quando são amplamente conhecidas as dificuldades das usinas em renovação de canavial que está aí, na utilização de defensivos e tratos culturais com tantos problemas de caixa as afetando.

A ATR para a próxima safra dificilmente será melhor do que a safra anterior (de 138,36 por tonelada de cana, segundo o último relatório da UNICA). A redução de disponibilidade de açúcar deve ocorrer porque a arbitragem do etanol com o açúcar remunera o primeiro a pelo menos 100 pontos acima do segundo, apesar da queda acumulada de 13% no mês.

Também vale observar que o consumo de etanol deve continuar a crescer. Para mudar o mix, ou seja, para que as usinas decidam produzir mais açúcar, os mercados interno e/ou externo terão que pagar o preço. Considere também que o início de safra deve ser mais alcooleiro pela necessidade que as usinas tem de transformar mais rápido produto em dinheiro. Logo, a disponibilidade de açúcar estará comprometida.

As incertezas são grandes: o número de possibilidades conjugadas com preço, moeda, petróleo, clima, entre outros fatores criam uma matriz de decisão complicada. Gostamos de usar alguns dados para situar melhor o atual momento do açúcar em reais por tonelada. De 2014 para cá, portanto, em pouco mais de 5 anos, em valores corrigidos para hoje, o fechamento do açúcar em NY combinado com o fechamento do dólar pelo Banco Central em 40% das vezes esteve acima de R$ 1,125.10 por tonelada FOB Santos com prêmio de polarização (exatamente o preço de fechamento desta sexta-feira). Metade das vezes esteve acima de 1,024 reais por tonelada. Em apenas 20% das vezes esteve acima de 1,366 reais por tonelada.

Dada a possibilidade de alteração na percepção do mercado em relação à oferta de açúcar do Centro-Sul, é razoável pensar que iremos ter preços melhores em reais por tonelada logo adiante. No mesmo período de cinco anos, quando NY atingiu a mínima de 9,83 centavos de dólar por libra-peso em setembro do ano passado, o valor ajustado corresponde hoje a 954,52 reais por tonelada. Em apenas 38% das vezes (Fibonacci??) o mercado esteve abaixo desse valor.

Mudando um pouco de assunto, depois de semanas de sonolentas sessões no contrato futuro de açúcar em NY, na última segunda-feira assistimos atônitos à negociação de um volume recorde de opções de compra. Mais de 130.000 contratos foram freneticamente negociados em apenas uma sessão no que pareceu ter sido uma liquidação maciça de posições compradas em calls (opções de compra), provavelmente por parte de fundos. Como sempre ocorre em situações como essa, que não se tem a menor ideia do que está acontecendo, nem de quem está operando, ou seja, lá o que esteja por trás dos acontecimentos, várias teorias pipocaram.

Alguns traders explicavam que o enorme volume negociado se deveu aos fundos que estavam mudando a visão altista que tinham para o açúcar e por essa razão liquidaram as opções compradas que serviam – ainda segundo eles – de proteção contra eventual problema climático no Centro-Sul. O fato é que os fundos não mudaram sua visão, eles estão pesadamente vendidos em NY, segundo relatório do CFTC, em cerca de 114 mil contratos. Se isso for altista, eu não sei o que baixista significa.

Um corretor de futuros nos EUA alertou que nenhum dos negócios feitos com opções na segunda-feira passou por qualquer corretora, mas pela bolsa diretamente, o que nos leva a concluir que podem ter sido apenas “algo trading” (uma ferramenta de investimento que realiza negociação de ativos financeiros ou commodities, de forma automática, baseando-se em modelos matemáticos e inteligência artificial). De qualquer forma, um volume como esse, sem aparente razão, sem que ninguém saiba de onde veio, mereceria especial atenção da própria bolsa ou do CFTC, não é mesmo? Vamos esperar sentados. 

 

Por Arnaldo Luiz Corrêa

Fonte: Archer Consulting