Etanol deixará de valer a pena com a nova gasolina? Não é bem assim
31-08-2020

Melhora no consumo da nova gasolina em relação ao etanol é irrisória, especialmente em motores mais antigos, diz especialista Imagem: Geremias Orlandi/Futura Press/Folhapress
Melhora no consumo da nova gasolina em relação ao etanol é irrisória, especialmente em motores mais antigos, diz especialista Imagem: Geremias Orlandi/Futura Press/Folhapress

Desde o dia 3 de agosto, começou a valer a nova especificação da gasolina, que deverá estar disponível em 100% dos postos do Brasil até o início de novembro – embora já seja comercializada há muitos meses em boa parte do território nacional.

Segundo a Petrobras, maior produtora do combustível derivado do petróleo no País, a nova gasolina traz mais eficiência energética e a promessa de reduzir o consumo em até 6%. Além disso, informa a ANP, a novidade facilita identificar eventual adulteração.

Com a alegada melhoria no rendimento, acompanhada de preço mais alto, fica a questão: vai mudar a histórica relação 70/30 para calcular qual é a opção mais vantajosa, entre gasolina e etanol?

Desde o surgimento dos carros flex, há mais de 15 anos, a escolha tem sido feita por meio de uma conta simples.

Tem funcionado assim: como o combustível de origem vegetal apresenta consumo aproximadamente 30% maior ante a gasolina “antiga”, só vale a pena usá-lo quando a diferença no preço superar percentualmente o gasto extra de combustível.

Para saber se o cálculo mudou, UOL Carros consultou o engenheiro mecânico Renato Romio, chefe da Divisão de Motores e Veículos do Centro de Pesquisas do Instituto Mauá de Tecnologia.

De acordo com o especialista, a conta não muda por um motivo simples: o ganho em consumo da nova gasolina é muito pequeno e, além disso, depende de fatores como modelo do veículo, condições das vias, manutenção e estilo de condução.

Isso sem contar que, segundo a ANP e a Petrobras, os benefícios da nova formulação são mais perceptíveis em motores modernos – especialmente os equipados com turbo e injeção direta de combustível, que ainda representam uma parcela relativamente pequena da frota.

Também vale destacar que o percentual de etanol anidro foi mantido em 27% para as gasolinas comum e aditivada e em 25% para a gasolina premium com a nova formulação.

“Em relação à autonomia proporcionada pela nova gasolina, o consumidor não vai notar diferença alguma no dia a dia”, afirma o especialista.

De acordo com Romio, “mesmo que o usuário perceba melhora no consumo, não vai identificar a razão disso, pois a diferença é irrisória”.

Renato Romio explica que o etanol hidratado, aquele usado para abastecimento de veículos, apresenta maior consumo porque sua densidade energética é cerca de 30% menor ante a gasolina. Portanto, requer maior gasto de combustível para percorrer a mesma distância.

Por outro lado, explica o engenheiro, o derivado da cana-de-açúcar queima mais rapidamente do que a gasolina – essa é a razão de muitos motores flex entregarem mais potência e torque ao serem abastecidos com etanol.

Rogério Gonçalves, especialista em novos produtos da Petrobras e diretor de combustíveis da AEA (Associação Brasileira de Engenharia Automotiva), destaca que a nova gasolina pode reduzir essa diferença na performance entre os dois combustíveis em carros flex.

Por outro lado, a nova especificação não proporciona potência ou torque acima dos valores máximos informados pela montadora para determinado modelo de veículo, esclarece.

A nova especificação determina que a gasolina comum, seja importada ou fabricada no Brasil, tenha massa específica mínima de 715 kg/m³ e octanagem de pelo menos 92 octanas de acordo com a metodologia RON (research octane number ou método de pesquisa).

Rogério Gonçalves explica que massa específica, em linhas gerais, é a densidade, enquanto a octanagem mede a resistência do produto à combustão – quanto mais alta, o combustível aceita maiores taxas de compressão e entrega mais desempenho.

Por sua vez, quanto maior for a massa específica, maior será a densidade energética.

A partir de janeiro de 2022, a gasolina comum nessa metodologia sobe para 93 octanas – a Petrobras, no entanto, adiantou-se e já produz esse combustível com a octanagem maior.

Já a gasolina premium deve ter pelo menos 97 octanas, seguindo a nova metodologia.

Esse novo parâmetro de octanagem, de acordo com a Petrobras, é “mais adequado às tecnologias de motores” mais recentes.

A terceira mudança é o ajuste na curva de destilação, termo técnico para dizer que a nova gasolina é menos volátil, proporcionando funcionamento mais uniforme do propulsor.

 

Alessandro Reis

Do UOL, em São Paulo (SP)