Etanol, uma oportunidade para o Brasil
29-10-2014

O título desse artigo pode levar o leitor a acreditar que foi enviado, em uma máquina do tempo, para a década de 70. Mas, como é frequente no Brasil de hoje, o presente ainda não conseguiu equacionar questões mal resolvidas no passado. O etanol é um exemplo inequívoco dessa persistência em manter como problema o que, sabidamente por todos, deveria ser visto como solução.

Lançado nos meados dos anos 70, o Proálcool tinha a ambição de se tornar uma alternativa aos combustíveis fósseis, contribuindo para o superávit da nossa balança comercial. Muitos recursos e energia foram despendidos para colocar o etanol em condições de competitividade com a gasolina.

Na década de 90, o Brasil virou exemplo para o mundo. Em particular, nos EUA, o nosso outrora Proálcool se tornou uma referência de um programa alternativo de energia bem sucedido. A indústria automotiva contribuiu muito ao lançar os veículos flexíveis, que podem alternar, de acordo com os desejos do usuário, etanol hidratado e gasolina.

Hoje, no entanto, há uma enorme crise do setor. Segundo dados da Única, desde a crise financeira mundial em 2008 até 2013, mais de 70 usinas já fecharam as portas no Brasil. Somente na região Centro-Sul, outras 12 unidades devem encerrar suas atividades em 2014. Apenas nos últimos dois anos, houve perda de mais de 60 mil empregos diretos no setor, que está endividado, com grande parte da sua receita comprometida com o pagamento de juros.

Apesar de todas as vantagens já conhecidas para o etanol e do nosso pioneirismo no desenvolvimento desse combustível, motivos econômicos e tecnológicos nos levaram à crise atual. Sabe-se que, para ser competitivo, o etanol hidratado precisa ter um preço no patamar de, no máximo, 70 % do praticado para a gasolina.

Portanto, se o preço da gasolina estiver muito baixo, o preço do etanol também será muito baixo. E é exatamente isso que aconteceu no Brasil nos últimos anos, quando o governo não permitiu que a Petrobras reajustasse seus preços de acordo com o mercado internacional.

Mais ainda: a Cide, que é um imposto também utilizado para dar competitividade ao etanol e que, segundo estimativas, hoje deveria estar em torno de R$ 0,50/l, está zerada. Além disso, essa contribuição também foi criada para reduzir a volatilidade dos preços dos combustíveis, atuando como um colchão anticíclico, mas não tem cumprido essa função de reduzir as incertezas do setor. Na verdade, a formação de preços dos derivados de petróleo no Brasil é desconhecida, fazendo com que não haja previsibilidade nos preços do etanol.

O setor também tem problemas tecnológicos a enfrentar. A produção de etanol em 1969 era de 2400 l/ha. Hoje é de 7000 l/ha. Avançamos pouco e precisamos, no mínimo, dobrar este indicador. Hoje, temos a concorrência com o etanol do milho, produzido em larga escala nos EUA, já desenvolvido geneticamente.

Há um esforço no Brasil de se fazer um processo semelhante com o etanol de cana. A expectativa é que, quando isto ocorrer, a nossa produtividade se torne muito maior, pelas vantagens que a cana apresenta, quando comparada ao milho. É também importante o desenvolvimento de etanol de segunda geração, a partir de bagaços e folhas.

O Brasil precisa, assim, voltar a fortalecer o setor de etanol. Para tanto, devem estar disponíveis os financiamentos para a renovação e ampliação dos canaviais. É preciso aumentar os investimentos no desenvolvimento tecnológico do setor e agir, na esfera internacional, para tornar esse combustível uma commodity, com padrões de qualidade e preço estabelecidos. E, por fim, é necessário corrigir as distorções de preço de combustíveis, razão principal para a crise atual.


Julio Bueno - Secretário estadual de Desenvolvimento Econômico, Energia, Indústria e Serviços do Rio de Janeiro