Fortes emoções à vista
01-07-2019

O mercado de açúcar em NY encerrou a sexta-feira a 12.78 centavos de dólar por libra-peso, um aumento bastante robusto em relação à semana anterior (que foi de 12.22). Nós assistimos à expiração do contrato futuro de açúcar de NY com vencimento julho/2019 seguida de uma entrega surpreendente e recorde de 2.1 milhões de toneladas de açúcar, quebrando a marca anterior ocorrida em maio de 2015.

Entregas volumosas normalmente são percebidas com indisfarçável tom baixista, mas não se pode generalizar que essa se inclua nessa categoria. Um volume dessa proporção evidentemente manifesta que os vendedores (curiosamente, 97% do volume de empresas com base na Ásia) não conseguiram melhor preço do que aquele negociado pela Bolsa, ou não conseguiram se livrar dos açúcares que possuíam nas origens sem oferecer descontos que forçosamente teriam que ser maiores do que o custo de carregarem o próprio açúcar até que os compradores apresentassem o navio.

Há de se refletir, com o devido cuidado, que uma entrega nessa altura da safra do Centro-Sul, em que apenas 30% do que se estima moer já foi moído, pode ser um enorme incentivo para que as usinas continuem se beneficiando da produção de etanol e, consequentemente, podem caminhar para uma redução significativa de açúcar para o mix desta safra.

A pergunta que fica no ar, segundo um trader, é por que uma trading com refinarias na Austrália, Índia, Indonésia, Marrocos e Nova Zelândia está entregando açúcar e, entre os recebedores, tradings ligadas a produtores estão recebendo açúcar? Uma situação pontual apenas? O fato de a China ter emitido licenças de importação de açúcar concedidas até o limite de 1.35 milhão de toneladas pode ter aberto espaço para a arbitragem de açúcar de outras origens e desempenhado um papel na entrega? Vamos ter que observar.

A elevação do preço do açúcar em NY na quinta-feira e o estreitamento do spread julho/outubro um dia antes da expiração, juntamente com o fortalecimento de outros spreads ao longo da curva de preços de NY, mostram que vários operadores estão efetivamente preocupados com as mudanças relativas à disponibilidade do açúcar para o terceiro e quarto trimestre do ano. Explicam também, segundo um outro executivo do mercado, porque empresas como Alvean, uma joint-venture (JV) entre Cargill e Copersucar, estariam recebendo açúcar. Ao fazê-lo, estão basicamente operando a arbitragem açúcar x etanol, vendendo/produzindo o combustível renovável que negocia com prêmio sobre o açúcar, e compram o açúcar mais barato via recebimento em bolsa. Simples assim.

Em outras palavras: receber açúcar em julho pode ser uma excelente oportunidade de compra. A posse de um produto num horizonte de três meses adiante, considerando que o mercado tem estado num intervalo de preços bem contido, sem grandes traumas e sustos, uma interessante estratégia enquanto novos elementos vão gradativamente compondo o cenário de preços até outubro: tamanho da moagem de cana no Centro-Sul, o mix da safra, quanto a Índia vai produzir na 19/20, o mercado de petróleo se o conflito EUA x Irã recrudescer, questões climáticas no inverno brasileiro.

Se o mercado de açúcar explodir em função de qualquer um desses elementos, ou da combinação de dois ou mais deles, os atuais recebedores ganham não apenas na elevação dos preços, mas também na valorização do basis (prêmio) no mercado internacional, ou seja, parece-nos que o risco potencial negativo de tal estratégia é limitado. Um golpe de mestre? Temos um par de meses para descobrir.

Há também o fato de que o começo alcooleiro na moagem da atual safra irrompeu o surgimento de operações de wash-out, ou seja, no cancelamento de contratos a termo de entrega de açúcar para que as usinas aproveitassem o bom momento do etanol que negociava acima da commodity. Com isso, o recebimento por parte da JV serviria para equacionar o déficit provocado por esses mesmos wash-outs. São apenas conjecturas.

Qual será a reação do mercado na abertura de segunda-feira? Vai depender das origens que serão entregues. Quanto mais açúcar do Centro-Sul fizer parte do montante a ser entregue, mais restrita e, por isso preocupante, será a disponibilidade de açúcar novo para a safra corrente proveniente do Brasil com consequências diretas na disponibilidade global para o último trimestre do ano. Não vai ser por falta de emoção que vamos morrer no segundo semestre.

Nos últimos 8 anos-calendários, apenas no ano de 2016 vimos o preço médio negociado em NY no segundo semestre do ano ser superior àquele negociado no primeiro trimestre. Até aqui, o preço médio do semestre que se encerrou na sexta-feira foi de 12,49 centavos de dólar por libra-peso!! Quando o segundo semestre supera o primeiro, na média, a valorização é de 31%. Mais uma a conferir.


Por Arnaldo Luiz Corrêa

Fonte: Archer Consulting