Inocular bactérias na cultura da cana pode ser mais eficiente que usar fertilizantes
11-04-2017

Estudo feito em colaboração por pesquisadores do Brasil e da Holanda recomenda uso de inoculantes bacterianos (foto: Eduardo Cesar/Revista Pesquisa FAPESP)
Estudo feito em colaboração por pesquisadores do Brasil e da Holanda recomenda uso de inoculantes bacterianos (foto: Eduardo Cesar/Revista Pesquisa FAPESP)

A interação entre o microbioma da raiz da cana-de-açúcar e bactérias promotoras do crescimento da planta pode garantir maior eficiência às lavouras. Em solos férteis, tal interação entre microrganismos da planta e bactérias teve resultado ainda melhor do que a adubação nitrogenada, comumente usada em lavouras de cana e que tem alto poder de contaminação do solo, de rios e até do lençol freático. É o que foi constatado na pesquisa “Harnessing the rhizosphere microbiome to enhance plant productivity”, apresentada no dia 5 de abril no Biobased Economy Workshop, realizado no auditório da FAPESP, em São Paulo.

O trabalho tem apoio do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) e da Netherlands Organisation for Scientific Research (NWO).

No painel apresentado por Eiko Kuramae, do Netherlands Institute of Ecology, e Adriana Silveira, do Instituto Agronômico (IAC), as pesquisadoras mostraram resultados de estudos sobre a inoculação de bactérias promotoras do crescimento da cana-de-açúcar.

“Vimos que, em solo fértil, a inoculação de bactérias tem maior efeito que a adubação nitrogenada. A planta respondeu muito mais. Em solo pobre, com alumínio e pH baixo, a inoculação protegeu a planta, mostrando que mesmo em condições adversas ela promoveu seu crescimento”, disse Silveira, do Instituto Agronômico, também pesquisadora do Projeto Temático “Nutrição nitrogenada de cana-de-açúcar com fertilizantes ou bactérias diazotróficas”, apoiado pela FAPESP.

A equipe de pesquisadoras trabalhou com o desenvolvimento inicial da planta em vasos e o próximo passo será levar o trabalho para campo. “O que podemos afirmar até agora é que, diferentemente do que ocorre na cultura da soja – onde a recomendação é o uso do inoculante rizóbio em substituição total à adubação nitrogenada –, na cana existe a recomendação do uso de inoculantes bacterianos, mas não a total substituição”, disse Silveira.

A adubação nitrogenada é usada em grandes quantidades para a produção de etanol da cana. Estima-se que 23% do uso de nitrogênio como fertilizante no Brasil esteja em lavouras de cana-de-açúcar. Além de ser o nutriente vegetal mais caro no mercado, os fertilizantes nitrogenados têm peso importante no orçamento ambiental da produção de biocombustíveis.

Seu uso acarreta a emissão de óxido nitroso – um potente gás de efeito estufa associado ao uso de fertilizantes, contribuindo para os custos ambientais do etanol, além do alto poder de lixiviação e de contaminação do solo e de lençóis freáticos.

Tomates com genes resistentes

Genes resistentes aos begomovírus e tospovírus, que atingem plantas e são encontrados no tomate e no pimentão, também foram tema do Biobased Economy Workshop. Richard Kormelink, da Universidade de Wageningen, e Renato Resende, da Universidade de Brasília, apresentaram avanços no conhecimento do mecanismo de defesa de genes resistentes aos vírus em hortaliças.

Diferentemente das doenças provocadas por outros patógenos, para tais tipos de vírus não existem agrotóxicos conhecidos capazes de atuar diretamente na infecção viral.

“Apenas cerca de 20 vírus de plantas causam todos os anos nas lavouras do mundo perdas da ordem de US$ 20 bilhões. Quase metade (47%) dos novos vírus responsáveis por doenças infecciosas promove problemas em plantas”, disse Kormelink.

Os pesquisadores identificaram que proteínas relacionadas ao movimento das células e supressão de silenciamento gênico são determinantes para a ativação dos dois únicos genes de resistência disponíveis para melhoramento genético, denominados Sw5 e Tsw. Além disso, clonaram e identificaram o primeiro gene de resistência ao begomovírus TYLCV, denominado Ty 1.

“Queremos entender o mecanismo de como o vírus quebra a resistência do gene para antecipar um problema, ou o que chamamos de ‘piramidizar’, quando pegamos vários genes de resistência e colocamos em uma planta só. Como ele tem vários mecanismos de defesa, essa resistência pode se tornar ainda mais ampla”, disse Resende.

Candeia e bisabolol

Outro estudo apresentado no evento contribuiu para ajudar a salvar de ser extinta uma árvore endêmica do Brasil: a candeia [Eremanthus erythropappus]. Descobriu-se que, com 30 mil metros cúbicos de madeira, o que equivale a aproximadamente 1.000 hectares de floresta, era possível extrair 250 toneladas de bisabolol por ano, disse Tierry Delatte, da Universidade de Wageningen.

O bisabolol é um óleo com efeitos anti-inflamatório, antifúngico, antibacteriano e cicatrizante com longa história na indústria farmacêutica. Atualmente, a produção comercial do óleo depende inteiramente das árvores de candeia.

A equipe de pesquisadores está estudando a possibilidade comercial de retirar o bisabolol de uma planta ornamental, a canelinha (Nectandara megapotâmica). Também trabalham no sequenciamento genético da candeia e no desenvolvimento de um processo biotecnológico para produção do bisabolol em diferentes espécies e a criação de uma fazenda de candeias.

A parte genética do projeto está toda nas mãos da equipe brasileira. “Por causa do protocolo de Nagoya, que protege os recursos genéticos da biodiversidade, tudo está sendo feito no Brasil com pesquisadores brasileiros, coordenados pelo meu colega Carlos Carollo, da Universidade Federal do Mato Grosso do Sul”, disse Delatte.