Juiz protege ações de Braskem de qualquer execução
21-06-2019

A recuperação judicial da Odebrecht, de R$ 98,5 bilhões, protegerá o grupo não apenas contra a execução de dívidas por credores como também impedirá que as companhias que foram dadas em alienações fiduciárias a bancos, a petroquímica Braskem, a de navios-sonda Ocyan e a produtora de etanol Atvos, sejam vendidas. O juiz João de Oliveira Rodrigues Filho acatou todas as solicitações feitas pelo grupo ainda no fim da noite da segunda-feira, data do pedido levado à 1ª Vara de Falências.

Como as ações dessas três controladas foram cedidas em garantia, as dívidas a que estão atreladas são consideradas extraconcursais, e, portanto, não são elegíveis para a recuperação judicial. Em tese, isso deixaria esses credores livres para executar tais ativos, ou seja, solicitar a venda dos papéis, pois a recuperação judicial leva a uma antecipação de todos os vencimentos. Mas a Odebrecht se adiantou e pediu que isso fosse evitado. O juiz garantiu o pleito por meio de uma decisão liminar.

Braskem, Ocyan e Atvos foram descritas na petição inicial da ODB como ativos essenciais à sobrevivência do conglomerado. A petroquímica é a mais relevante das três e respondeu por cerca de 80% da receita de todo o grupo em 2018. É a única que possui ações listadas na B3. A participação da Odebrecht, de 38% do capital total, é avaliada hoje em R$ 10,8 bilhões, a preços de bolsa.

Conforme o Valor apurou, caso os bancos credores se comprometam a não executar as ações, a Odebrecht não descartaria substituir a liminar por um acordo vigente pelo período da recuperação, até a aprovação do plano em assembleia. O pedido ao juiz foi com base no artigo 49 da Lei de Falências. Embora as ações não sejam bens físicos (como os exemplificados no texto da lei), são os únicos ativos de uma sociedade holding e, por isso, cabem na finalidade prevista na legislação.

"Sem dúvida", afirma o juiz na decisão, "a retenção das ações (...) permitirá se chegar numa solução mais sólida de soerguimento da atividade, até mesmo pela maior tranquilidade de construção de plano de recuperação (...), sem prejuízo de um ambiente de diálogo com os credores antes da AGC [assembleia geral de credores]".

Essas empresas não são importantes só para sustentação da Odebrecht durante a recuperação judicial. São os ativos que servirão como pilar da própria renegociação das dívidas, em especial a Braskem, a Atvos e mais a construtora OEC, após sua própria recuperação extrajudicial para reequilibrar débitos de R$ 12 bilhões.

Embora débitos extraconcursais fiquem de fora das recuperações judiciais, não é raro que sejam rediscutidos na negociação geral. Isso em especial quando os credores quirografários (sem nenhuma garantia) são em boa medida os mesmos, como é o caso da Odebrecht.

O grupo cedeu as três companhias durante as reestruturações financeiras que teve de fazer após a Operação-Lava Jato, a partir de 2016. No total, o grupo reorganizou R$ 27 bilhões em compromissos. A Braskem foi dada em garantia, pela primeira vez, em 2016. Depois disso, tal contrato foi aditivado duas vezes e hoje garante R$ 12,7 bilhões em créditos de Itaú, Bradesco, Banco do Brasil, BNDES e Santander. Ocyan atende exclusivamente ao BNDES e Atvos, a credores do Peru.

Na época desses acordos, houve críticas à opção do conglomerado. Pessoas próximas ao grupo e especialistas defendiam que a Odebrecht deveria ter pedido a recuperação judicial antes de ceder todos seus principais negócios aos bancos. O argumento é que os ativos mais valiosos foram "consumidos" sem resolver as dívidas de forma definitiva e reestruturante.

A Odebrecht buscou, até a véspera do pedido à Justiça, uma negociação privada com os bancos brasileiros. Mas, alguns atores envolvidos nas conversas passaram a defender que o ambiente judicial seria o único seguro para promover uma reorganização das finanças envolvendo as garantias já fornecidas em outras renegociações.

No fim da tarde de ontem, aconteceu a primeira audiência entre representantes da Odebrecht e dos principais bancos credores, com exceção de Itaú, e o juiz. O tema das garantias foi abordado. Inicialmente, o encontro era sobre Atvos, que está em recuperação judicial desde 29 de maio, mas o debate se ampliou.

Os credores mostraram disposição de negociar. As conversas a respeito de rever as garantias com Braskem já vinham ocorrendo antes e a ideia estava avançando, segundo diversas pessoas envolvidas no debate.

Na petição inicial, a Odebrecht relatou ao juiz a existência de um acordo com os bancos credores para ficar com R$ 500 milhões de dividendos que possam vir a ser pagos pela petroquímica, relativos a uma distribuição de R$ 2,67 bilhões já aprovada pelo conselho de administração da empresa. O pagamento ficou pendente devido a um embate com Ministério Público de Alagoas e, por isso, será reavaliado pelo conselho. A fatia da Odebrecht seria de R$ 1 bilhão, mas ela ficará só com metade, se houver ratificação pelo colegiado. Desde que assumiram as ações em garantia, há três anos, os bancos é que recebem os proventos. Neste ano, terão apenas uma parte.

 

Valor Econômico