Mercado sobrevive abaixo do custo de produção?
23-03-2015

O mercado de açúcar em NY encerrou a semana praticamente inalterado nos primeiros dois meses de negociação - maio e julho de 2015 - com ligeira alta nos meses seguintes até outubro de 2016 quando se viu pequena queda. São ajustes relacionados à moeda, segundo um trader do mercado, cujo valor ascendente ao longo da curva do câmbio (via NDF) pressiona os valores do açúcar em NY. Só para constar, os valores negociados a partir de março de 2016 se hedgeados de maneira adequada utilizando-se dos instrumentos financeiros disponíveis no mercado, mostram valores de fixação superiores a R$ 1,050 por tonelada FOB trazidos para valor presente descontada a taxa de juro praticada pelo Governo. Quem estiver estruturado para operar dessa forma, está fixando a preços muito convidativos. Isso vai continuar a pressionar NY se o real continuar se desvalorizando.

O dólar tem se valorizado em relação às outras moedas atingindo diretamente o preço das commodities no mercado internacional. O impacto dessa desvalorização favoreceu alguns países que viram o custo de produção de suas matérias primas ficar mais barato em dólares e consequentemente trazendo vantagens competitivas para alguns deles. No caso especifico do açúcar, analisamos o custo de produção de alguns países que competem com o Brasil no mercado internacional. O resultado acende uma luz de preocupação sobre a perenidade da participação desses países nos próximos anos, encarando um custo de produção interno muito acima do valor praticado no mercado internacional. Não se consegue sobreviver nesse ambiente a menos que haja pesados subsídios, como é o caso da Índia.

Desde meados de 2012 quando fizemos uma apuração do custo de produção da Tailândia, Índia, Austrália, África do Sul e Brasil, para citar alguns, até hoje podemos observar alguns pontos que merecem destaque. Desses produtores, o Brasil é aquele que teve sua moeda mais desvalorizada no período observado, com 36.57% de queda do real em relação ao dólar. Ao mesmo tempo, enquanto o custo de produção na usina, sem custo financeiro, estava em 15.43 centavos de dólar por libra-peso, hoje sob o mesmo parâmetro está em 11.71 centavos de dólar por libra-peso. É bom que se diga que esse valor não propicia margem às usinas uma vez que para levar esse açúcar até o porto, o custo aproximado hoje é de 180-200 pontos, ou seja, eleva o custo equivalente FOB Santos para 13.50-13.70 centavos de dólar por libra-peso, bem acima do preço de fechamento de NY nesta sexta-feira.

A África do Sul é o segundo país da lista com a maior desvalorização: 31.56% de junho de 2012 até hoje. Seu custo de produção de açúcar na usina despencou de 14.14 centavos de dólar por libra-peso em 2012 para 11.14 centavos de dólar por libra-peso. A Austrália viu o dólar australiano se desvalorizar em relação à moeda americana em nada menos que 24.34%. Dessa forma, o custo de produção de açúcar naquele país caiu de 15.27 centavos de dólar por libra-peso para 12.38 centavos de dólar por libra-peso.

A dificuldade para se sobreviver nesse mercado de preços baixos em dólares é dividida entre dois países produtores: Índia e Tailândia. O açúcar na Índia, cuja moeda se desvalorizou em 9% nesse período de dois anos e meio, tem um custo de produção estratosférico, apesar do subsidio generoso de 64 dólares por tonelada. Nada menos que 23.17 centavos de dólar por libra-peso (que com o subsidio chega perto de 20 centavos de dólar por libra-peso). Na Tailândia, exportador vigoroso de açúcar, cuja moeda praticamente permaneceu inalterada desde 2012, desvalorizando apenas 3%, o custo de produção (difícil de se obter junto às autoridades daquele país, notórias por esconder essa informação de quem quer que seja) é estimado em 16.21 centavos de dólar por libra-peso. Como sabemos, a produção naquele país cresceu vertiginosamente, praticamente dobrando nos últimos dez anos (de 5 para 10 milhões de toneladas).

Quanto tempo os produtores de açúcar de outros países (Tailândia, principalmente) conseguem sobreviver com os atuais preços baixos praticados no mercado internacional, é uma pergunta de um milhão de dólares. Quem se dispõe a responde-la?

De acordo com o modelo desenvolvido pela Archer Consulting, o volume de fixação das usinas para a safra 2015/2016, até 28 de fevereiro de 2015 era de 34.05% das vendas exportação estimadas para a safra, com o preço médio de 16.91 centavos de dólar por libra peso, ou ainda pelo seu equivalente em reais de 42.25 centavos de real por libra peso (com prêmio de polarização).

No ano passado, no final de fevereiro, o volume fixado das usinas atingia 47.01% das vendas estimadas. O decréscimo no volume de fixação deste ano em relação ao do ano passado pode ser explicado por alguns fatores: 1. Falta de crédito para operações de hedge em NY, esteja a usina utilizando sua própria conta de futuros juntos às corretoras lá fora ou usando a conta de terceiros (em geral das tradings com quem negociam); 2. Menor volume contratual para essa safra (as tradings estão sofrendo de anorexia); 3. Incerteza em relação ao mix de produção, que pode disponibilizar menos açúcar para a exportação. O fato é que as fixações estão em ritmo mais lento

Arnaldo Luiz Corrêa é diretor da Archer Consulting - Assessoria em Mercados de Futuros, Opções e Derivativos Ltda.