O mercado quer açúcar branco
01-07-2014

Apesar de ser um sucesso agronômico, a variedade de cana RB92579 produz caldo escuro, dificultando a produção de açúcar branco. A indústria resolveu esse problema

Luciana Paiva

Mesmo possibilitando 30% a mais de produtividade em relação às outras variedades de cana, a Usina Caeté, em Alagoas, deixou de plantar a RB92579 porque ela produz caldo escuro o que dificulta a produção de açúcar branco, não atendendo clientes como a Coca-Cola que exige açúcar de cor baixa, e nem o mercado internacional, cujo padrão para exportação é abaixo de 150.
Em 2002, o alagoano Meroveu Costa era superintendente industrial da Usina Santo Antonio, em São Luiz do Quitunde, Alagoas, empresa que atuou por 20 anos. Meroveu conta que a partir desse ano, a usina passou a investir muito no plantio da variedade RB92579 porque apresentava resultados agronômicos fantásticos. “Agronomicamente ela é imbatível oferece maior produção, peso e proporcionalmente açúcar. A diferença achega a ser 30% superior as médias de outras variedades. Isso animou muito a usina, que foi ampliando ano a ano o plantio dessa variedade”, relembra.
A Santo Antonio é uma tradicional produtora de açúcar branco e VHP e com a entrada em maior volume dessa variedade passou a ter dificuldade na produção de açúcar, primeiro o branco e depois no VHP, por causa do caldo escuro da 579. “Na hora que mói o caldo é normal, mas cinco minutos depois, ele fica totalmente preto, porque é uma cana muito rica em compostos de conferem cor e também porque contém elementos de proteção”, explica Meroveu. Isso passou a ser um problema, porque o mundo quer açúcar de qualidade. “Antes se produzia açúcar demerara sem especificação de cor, tinha 2000, 3000 de cor. Depois veio o VHP, depois virá o VVHP, o que é normal, pois as refinarias querem um açúcar mais branco para facilitar a sua produção e gastar menos insumos.”
CALDO ESCURO
Meroveu conta que apresentaram ao setor a questão: a cana é um sucesso agronômico, não apresenta problema de processamento, mas apresenta um problema de cor. E se há contrato para fornecer açúcar, não adianta ser uma maravilha no campo, se não cumpre as exigências do contrato. “No início isso chocou muita gente, acharam que éramos contrário à variedade. De forma alguma, o que dizíamos é que: com o aumento dessa variedade e com a tecnologia que havia na indústria, não conseguimos fazer açúcar que o mercado exige.” O setor procurou por empresas interessadas em desenvolver uma solução para o problema, mas não houve candidatas. Nem por isso a direção da Santo Antonio admitiu reduzir a participação da 579, pelo contrário foi aumentando a cada ano, chegando a 47% de sua produção. Com isso, basicamente se afastou do mercado de açúcar branco e passou a ter mais perdas industriais, porque tinha que lavar mais as massas de açúcar. “A diretoria, ao meu ver sabiamente, não aceitava reduzir essa variedade. E nos induziu a encontrar soluções na indústria”, conta Meroveu.

BUSCA PELA SOLUÇÃO DO PROBLEMA
Foi aí que entra na história o engenheiro químico José Raimundo, que prestava serviços a Santo Antonio. Iniciou-se, entre os anos de 2003 e 2004, no laboratório da usina uma série de pesquisas com instrumentos científicos de precisão ainda não utilizados pelo setor, para o desenvolvimento de uma nova tecnologia. Que começou a ser testada na planta da Santo Antonio a partir da safra 2008/09 e nas safras 09/10 e10/11 a tecnologia foi aplicada em escala industrial. Em 2012, Meroveu e José Raimundo receberam o convite do empresário Roberto Maia (com 60 de experiência na área de indústrias químicas e que já tinha ouvido falar na tecnologia e acreditava nas mudanças que ela promove) para fundar uma empresa e comercializar esta tecnologia. Assim, Meroveu, José Raimundo, Roberto Maria, em acordo com a Santo Antonio, fundaram, em fevereiro de 2012 a Prosugar.
NASCE A PROSUGAR E O QUE FAZ A TECNOLOGIA
“Quando desenvolvemos esta tecnologia, não pensamos em abrir empresa, só fizemos por uma necessidade. Mas o resultado nos levou a isso. A Prosugar é uma empresa de desenvolvimento de novas tecnologias, nasceu com essa razão e existimos com esse propósito”, salienta Meroveu e ressalta que a tecnologia Prosugar não é um simples clarificante, pois agrega valor.
Ele explica que a tecnologia remove os componentes que conferem cor sem leva-los para outras partes do processo. Consegue em todos ao aspectos da fábrica ter menos cor. Ou seja, menos cor nas massas, menos cor nos méis e no refinado. Isso aumenta o rendimento de açúcar por tonelada de cana, porque minimiza o consumo de água utilizada nas lavagens das massas de açúcar; diminuindo a lavagem reduz a presença do mel que está recirculando na fábrica reduzindo o consumo energético; outro aspecto que é importante é que como tem uma melhor qualidade dentro da planta de açúcar, consegue otimizar o consumo de tradicionais insumos como sulfitação, alguns clarificantes; outro ponto importante é a capacidade da geleificação da dextrana e do amido.
A Prosugar não é uma solução exclusiva para a variedade RB92579, mas para todas que apresentam caldo escuro, por exemplo a RB99395 que tem caldo mais escuro ainda. Estudos apontam que as variedades que apresentam maior produtividade têm grande possibilidade de terem mais compostos coloridos. Como é foco do setor desenvolver variedades cada vez mais produtivas e com mais açúcar, pode se tornar comum a presença de caldo escuro nas indústrias. Mas outros fatores também influenciam o escurecimento do caldo, como intensidade de pragas e a mecanização que leva à indústria uma série compostos que atrapalham o resultado final, entre eles, o amido e a tecnologia tem também o efeito de amenizar este amido dentro do processo industrial.
GANHOS COM A 579 COMPENSA AUMENTO NO CUSTO NA PRODUÇÃO DE AÇÚCAR
Com o surgimento da Prosugar, a usina Caeté que havia deixado de plantar a 579 por três anos, voltou a investir na variedade, que é a mais plantada no Grupo Carlos Lyra. “O uso da tecnologia eleva o valor do custo da saca de açúcar em R$1,0”, diz Luiz Magno Tenório de Brito, assessor diretoria-industrial do Grupo Carlos Lyra. “Mas o que ganhamos no campo é muito mais que esse R$ 1,0 a mais na saca”, salienta Fabrízzio Tenório, superintendente agrícola das três unidades do Grupo em Alagoas. Segundo Luiz Magno, a tecnologia Prosugar é a melhor que existe no mercado, pois o açúcar no armazenamento não escurece, o mesmo não acontece com outros produtos.
A Usina Caeté faz açúcar branco, já a Coruripe faz VHP. “A tecnologia Prosugar resolveu nosso problema. E é isso que precisa ser feito: as entidades de pesquisas desenvolvem variedades mais produtivas e a indústria ajuda a melhora-las. Tem gente que diz que não vai adquirir a tecnologia porque encarece a produção de açúcar e vai dar dinheiro a Meroveu. Isso é besteira, o importante é que os ganhos com a 579 representam muito mais do que a adição de R$ 1,0 na saca de açúcar”, afirma Cícero Bastos, gerente corporativo de planejamento de desenvolvimento agrícola do Grupo Coruripe.
Como a 579 já é a terceira variedade mais plantada no Brasil, a tecnologia Prosugar aumenta cada vez mais sua participação no mercado, estando presente em mais de 20 usinas nas regiões Nordeste, Centro-Sul e também em outros países.