Odebrecht prepara saída judicial
05-06-2019

Apesar da crescente pressão de credores e da falta de alternativas para dar liquidez ao grupo Odebrecht, o patriarca Emílio Odebrecht e o presidente da holding, Luciano Guidolin, ainda não estão convencidos de que a recuperação judicial é o melhor caminho para lidar com dívidas de R$ 80 bilhões. Emílio já estaria demonstrando resignação, enquanto Guidolin prefere tentar o diálogo com credores. Mesmo com essa resistência, os preparativos estão em andamento e o pedido de proteção judicial contra credores deve ficar pronto na semana de 17 de junho, segundo fontes próximas à situação.

Após a holandesa LyondellBasell suspender as negociações para comprar a petroquímica Braskem, na segunda-feira, e o grupo pedir recuperação judicial da produtora de etanol Atvos, na semana passada, a via judicial para a holding ODB é considerada praticamente inevitável. Os bancos nacionais, credores de cerca de R$ 40 bilhões, já se conformaram.

Porém, a Odebrecht prefere e insiste em uma solução fora do ambiente judicial por considerar que um acordo ajudaria a reverter a percepção negativa que enfrenta. Segundo fonte próxima ao grupo, a questão financeira tem dificultado a recuperação reputacional.

Por isso, até segunda-feira, a perspectiva de venda da Braskem mantinha viva a expectativa de que seria possível iniciar uma conversa no formato desejado pelo grupo, reestruturação financeira em cada companhia e acordos para recuperações extrajudiciais.

O negócio poderia trazer à holding uma participação em ações na empresa combinada, a soma de Lyondell com Braskem (potencialmente a maior produtora de resinas plásticas do mundo), e mais alguma liquidez que poderia irrigar, ainda que em pequena quantidade, cada uma das companhias com problemas financeiros. As ações da Lyondell substituiriam os papéis da Braskem como garantia dada aos bancos desde 2016.

Para o negócio fazer sentido, a fatia de Odebrecht na Braskem, de 38% do capital total, precisaria ser avaliada em ao menos R$ 20 bilhões. Mas a petroquímica como um todo fechou a semana passada avaliada na B3 em R$ 34 bilhões.

Bancos públicos temem responsabilização por operações fechadas na gestão anterior e pressionam grupo

Hoje, parece estar nas mãos dos bancos públicos - BNDES, Banco do Brasil e Caixa - a decisão de precipitar a entrada do grupo em recuperação judicial. São eles os maiores credores e os mais expostos ao risco, com mais de R$ 25 bilhões. Itaú Unibanco, Bradesco e Santander possuem o menor volume em termos absolutos e, proporcionalmente, mais garantias, com dívidas somadas estimadas em menos de R$ 15 bilhões.

Com exceção da Caixa, todos esses bancos têm algum grau de cobertura em ações da Braskem. No total, R$ 12,7 bilhões em dívidas de controladas da ODB e, em especial, da própria holding, têm papéis da petroquímica como lastro.

As instituições públicas podem provocar um efeito dominó de vencimento antecipado de dívidas da ODB caso exerçam avais que possuem nas dívidas da Atvos. A Caixa, com créditos de R$ 500 milhões na produtora de etanol, tem dado cada vez mais sinais de estar disposta a isso. O discurso nos bastidores é que a Odebrecht representa a corrupção que esse governo tenta combater e que não há disposição de se responsabilizar por erros do passado.

A Caixa, incluindo FI-FGTS, tem exposição de ao menos R$ 3,7 bilhões ao grupo. Essas operações contam apenas com o aval da holding, garantia que, na prática vai perdendo valor à medida que os recursos minguam nos cofres da empresa. Por isso, o banco tenta desde março convencer os demais credores a lhe dar acesso às ações da Braskem. Até agora, não houve acordo e, segundo fonte próxima a um concorrente, "é tarde demais". O BNDES não se manifestou ontem sobre o risco de agravamento da crise da Odebrecht. O banco já fez uma provisão de cerca de R$ 5 bilhões para a Atvos.

O risco de uma execução das dívidas pela Caixa tem deixado em alerta os bancos privados. A Odebrecht, no entanto, continua a contar com o que chama de "racionalidade" dos credores, que nenhum deles executará garantias e se chegará a solução negociada.

O plano para a reestruturação das dívidas da ODB, com ou sem recuperação judicial, tem como meta transformar, em cada controlada, parte significativa das dívidas em instrumento semelhante a uma debênture de participação nos lucros (DPL), título muito parecido a uma ação, pois não possui vencimento nem juros, mas dá direito a dividendo préestabelecido. Esse foi o formato da recuperação extrajudicial feita na Atvos, em 2017, e é a proposta na mesa desde janeiro para cortar 70% de uma dívida de US$ 3 bilhões em bônus garantida pela construtora OEC.

Se a ODB for para o caminho judicial, também terão de adotar a mesma medida, pelo menos, a incorporadora OR e o estaleiro Enseada. A OEC ficaria de fora, pois é considerada viável a negociação com os donos dos bônus para uma recuperação extrajudicial.

Segundo fontes próximas à situação da Odebrecht, até a semana passada ainda havia disposição entre os bancos de promover negociações que culminassem em reestruturações extrajudiciais. Recuperações judiciais e extrajudiciais são os caminhos preferidos, no lugar de acordos completamente privados, pois valores perdoados de dívida podem ser convertidos em créditos fiscais pelos bancos.

Entre credores e pessoas próximas ao grupo, há críticas sobre a visão otimista da empresa e avaliação de que seus executivos atuam como se não tivessem ciência da gravidade da situação, o que levou a demandas exageradas em negociações para venda de ativos e reestruturação de dívidas. Também há queixas sobre os bancos públicos. Muitos dos envolvidos julgam que os gestores dessas instituições estão mais preocupados com o escrutínio do Tribunal de Contas da União (TCU) do que em encontrar uma saída para os créditos. Há, ainda, críticas à lentidão de alguns deles para tomar decisões e à demora da própria companhia em solucionar sua situação financeira.

Segundo fonte que conhece o grupo, a companhia preferiu fechar acordos de leniência e dar uma resposta à sociedade antes de solucionar as questões financeiras. O entendimento era o de que esse caminho, inclusive, ajudaria nas negociações com os credores.

Valor Econômico