Os dois lados da moeda
16-08-2018

Após dois anos de recuperação e preços de venda remuneradores, o setor produtivo de açúcar e etanol do Brasil volta a ligar o sinal de alerta. A conjunção de fatores negativos, com produção e estoques globais de açúcar altos, trouxe os preços da commodity para o menor nível no mercado internacional em uma década.

A alta no dólar no Brasil melhora a receita de produtores que conseguem exportar, mas custa caro manterfixações no mercado futuro, tanto para o açúcar quanto para a moeda norte-americana. Só as grandes empresas e as que estão capitalizadas, que são poucas, conseguem operar nesse mercado.

Uma saída que só os brasileiros têm é produzir etanol e há muito tempo as empresas não destinavam tanta cana-de-açúcar para obter o biocombustível. Mais de 60% da matéria-prima se transformou em álcoolprincipalmente o hidratado, na atual safra 2018/2019 do Centro-Sul do Brasil. O cenário não será diferente com o início da moagem na região Nordeste, em setembro.

Oferta em alta significa preço em queda. Para a alegria dos consumidores, os valores do hidratado recuam seguidamente nas bombas e hoje o etanol é mais competitivo economicamente do que a gasolina nos maiores mercados do Brasil. Como poucas usinas têm uma capacidade de estocagem e uma saúde financeira para manter o etanol guardado por um longo tempo, à espera de preços mais remuneradores, o cenário favorável ao consumidor deve seguir ao menos até outubro.

O consumidor brasileiro também pode comemorar a queda dos preços do açúcar no mercado interno.

Mesmo com uma produção menor do adoçante, a oferta das usinas segue alta por conta de estoques formados para uma exportação que não veio e o escoamento precisa ser por aqui. São dois lados da moeda. A alegria de uns vira preocupação no setor sucroenergético. Companhias que divulgaram os balanços do primeiro trimestre da safra 2018/2019 ou relataram prejuízos ou trouxeram quedas nos lucros, bem como redução no faturamento em comparação ao desempenho de igual período da safra passada.

Com os preços deprimidos e a necessidade de se fazer caixa para cumprir compromissos de curto prazo, a pressão de instituições financeiras aumenta e a onda de pedidos de recuperação judicial e fechamento de usinas, que já dura uma década, segue, mesmo que em menor ritmo. Uma saída para capitalizar o setor seria a nova política nacional de biocombustíveis, o RenovaBio, prevista para dar os primeiros resultados apenas na próxima década. Até lá, parafraseando o presidente da União dos Produtores de Bioenergia (Udop) e vice-presidente da Atvos, Amaury Pekelman, a preocupação do setor é sobreviver.

Gustavo Porto