Pesquisadores da USP de São Carlos criam plástico a partir do bagaço da cana-de-açúcar
06-10-2020

Pesquisadores da USP de São Carlos desenvolvem plástico a partir do bagaço da cana-de-açúcar. — Foto: Geovana Alves/G1
Pesquisadores da USP de São Carlos desenvolvem plástico a partir do bagaço da cana-de-açúcar. — Foto: Geovana Alves/G1

Estudo se destaca pelo ineditismo ao usar um poliol específico, que não possui registros anteriores de preparação e pela estratégia utilizada para fazer os compostos.

Por Geovana Alves*

Foi com uma técnica inédita que dois pesquisadores do Instituto de Química de São Carlos (IQSC) da Universidade de São Paulo (USP) desenvolveram um plástico a partir do bagaço da cana-de-açúcar.

A pesquisa teve como tema central o uso da biomassa da cana-de-açúcar para construção de outras moléculas com alto valor agregado. O professor Antonio Burtoloso e a doutoranda Camila Santos foram os criadores do produto sustentável.

Biomassa no Brasil

Eles explicam que o Brasil possui uma situação privilegiada para obter a biomassa, já que ela tem diversas origens possíveis como plantas, madeira, resíduos agrícolas ou restos de alimentos, sendo facilmente renovada.

A partir da decomposição química ou biológica destas biomassas é possível, então, obter uma série de moléculas orgânicas que servirão como matéria-prima para inúmeras transformações.

“Esses compostos que a Camila está utilizando como material de partida, a gente poderia obter também através de outras biomassas, mas é vantajoso usar a cana-de-açúcar, porque estamos no Brasil e há muito descarte. A gente gera muito bagaço, então, é natural que queiramos utilizar, enquanto os Estados Unidos, por exemplo, usam o milho, porque eles plantam muito”, disse Burtoloso.

O processo

O bagaço da cana-de-açúcar passa por um tratamento ácido com água, que converte a celulose em ácido levulínico. A partir dele, os pesquisadores preparam a gama-valerolactona, um composto que tem sido utilizado como solvente, para fazer o poliol que, na sequência, é transformado em plástico.

Uma amostra do material foi produzida em laboratório, mas Burtoloso e Camila ainda não sabem qual a melhor finalidade do produto, assim como sua real resistência e elasticidade, pois a análise das características será feita por outro professor. A etapa ainda não foi iniciada por causa da pandemia do novo coronavírus.

Diferenças

O professor do IQSC explicou que existem outros trabalhos que produziram monômeros, a partir da biomassa, que já são utilizados na indústria. Ainda assim, a pesquisa se destaca pelo ineditismo ao usar um poliol específico, que não possui registros anteriores de preparação.

Ele também reforça que a estratégia utilizada no processo pode ser considerada pioneira, já que a gama-valerolactona nunca foi usada para a ação específica que eles realizam para fazer os compostos.

Outro ponto relevante é que enquanto os monômeros conhecidos são menores, o deles possui ao menos 10 carbonos e, por isso, será diferenciado para fazer novos plásticos.

Custo-benefício

Segundo Burtoloso, o processo ainda é mais caro do que os realizados atualmente, mas, é crescente o interesse de outros países em substituir de 20 a 30% a matéria química que serve de base para a indústria, trocando o que vem do petróleo pelo o que vem da biomassa.

“O petróleo ainda é barato, mas imagine daqui a 30 anos com essas novas normas e tratados, onde não querem mais matéria-prima vinda do petróleo. Então, algum processo que esteja mais caro, futuramente pode ficar mais barato”, disse Burtoloso.

O professor explicou, contudo, que o processo ainda é longo para que as pessoas possam usar o plástico, pois, até o momento, os testes foram realizados apenas em escala laboratorial e será necessário financiamento para as próximas etapas do trabalho.

*Sob supervisão de Fabio Rodrigues, editor do G1 São Carlos e Araraquara.

 Fotos: Geovana Alves/G1