Presidente da FAEA defende PL que libera cultivo de cana de açúcar na Amazônia
17-04-2018

Afinal, a liberação do cultivo da cana de açúcar pode provocar efeitos catastróficos sobre a floresta amazônica, a biodiversidade, os serviços ecossistêmicos da América do Sul e a própria produtividade agrícola, como defendem pesquisadores Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa)? Ou o assunto não merece tanto alarde por se tratar de plantio apenas em áreas específicas da Região, como defende o presidente da Federação da Agricultura e Pecuária do Amazonas (Faea), Muni Lourenço.
Por força do decreto nº 6.961, que aprovou o Zoneamento Agro-Ecológico, desde 2009 o cultivo de cana de açúcar é proibido nos biomas do Pantanal, da Bacia do Alto Paraguai e da Amazônia Legal, por considerar que a atividade poderia comprometer a estabilidade ambiental da região. Entretanto, pequenos produtores do Amazonas continuem essa prática sem serem incomodados.
O assunto ganhou força quando voltou a tramitar no Senado o Projeto de Lei (PLS) 626/2011, que libera a atividade, desde que seja em áreas já desmatadas, sem capacidade de regeneração natural, e nos trechos de cerrado e campos gerais de estados como Tocantins, Mato Grosso e Maranhão.
“Nós, produtores rurais, defendemos a sustentabilidade e a possibilidade do plantio, de modo equilibrado, sem comprometer o meio ambiente. O projeto não permite o plantio com derrubada de florestas. Não há relação entre essa possível permissão e o desmatamento porque a liberação é para áreas que já estão degradadas”, argumenta Lourenço.
Ele assegura que o plantio já faz parte da cultura do pequeno produtor, que agora pode ter mais uma alternativa econômica, geradora de emprego e renda, em bases sustentáveis, sem agredir o meio ambiente. Segundo ele, vai impulsionar a economia do Estado com a instalação de pequenas agro-indústrias de derivados da cana-de-açúcar, de onde se tira o álcool e a ração para gado, dentre outros.
Para o pesquisador do Inpa, Philip Fearnside, os argumentos defendidos no projeto estão completamente “furados” e que a liberação desse tipo de cultura é um atrativo para que grandes empresários transformem a Amazônia numa grande lavoura de cana. “Isso de que vai sustentar a população amazônica, diminuir a pobreza, etc e tal, não procede porque a cana vai expulsando os pequenos agricultores. Normalmente onde isso entra, o efeito é negativo. E a mão de obra geralmente é migratória, tem até condições de trabalhos escravos”, alertou o pesquisador em matéria publicada em A CRÍTICA no dia 2 de abril.
Projeto polêmico
O polêmico Projeto de Lei (PLS) 626/2011 é de autoria do senador Flexa Ribeiro (PSDB-PA), natural do Pará, estado que mais desmata no Brasil, segundo dados do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe). Por falta de quórum o PLS 626/2011 não foi votado no último dia 27, como estava previsto, mas voltará à pauta a qualquer momento.
Limite de 20%
Pela legislação ambiental, as pastagens não entram no cálculo da reserva legal. Cada propriedade rural só pode ter 20% de sua totalidade devastada para tanto para a atividade agrícola quanto para a pecuária. E, pela legislação atual, hoje o produtor não pode usar nem 1% para o plantio de cana-de-açúcar.
De acordo com o presidente da Faea, as propostas do projeto de lei 626/2011 seguem as mesmas regras do Código Florestal Brasileiro. Com isso, caso o Projeto seja aprovado, o produtor somente poderá cultivar cana de açúcar dentro dos 20% de sua propriedade, reservada à agricultura e à pecuária.
O Ph.D em Mudanças Globais e Desenvolvimento Amazônico Philip Fearnside, em parceria com o doutorando em Ecologia, Lucas Ferrante, assinaram, em março, um artigo sobre o tema na revista científica Science. Eles classificam a situação como “grave” porque abriria mais uma porta para o desmatamento na Amazônia.
No artigo, os pesquisadores salientam que os políticos e as instituições nacionais e internacionais que financiam grandes empresas agrícolas não devem ser enganados pelo “doce sabor” de uma nova fronteira agrícola a ser explorada.
Brasil: maior produtor
O Brasil é o maior produtor de cana de açúcar do mundo, segundo dados da Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura (FAO). Especialistas acreditam que a produção de cana deve aumentar bastante nos próximos anos devido a demanda por biocombustíveis.
Números
3%. É o porcentual de floresta devastada no Amazonas, segundo a Federação da Agricultura do Amazonas, o que deixa a cobertura original do Estado praticamente intacta.