Quais as recomendações para viabilizar os canaviais transgressivos?
04-12-2020

Os canaviais transgressivos são viáveis para a canavicultura brasileira.

Por: Paloma Minke

O caminho que leva a esse patamar é a adoção de ciência e tecnologia. Mas o que são canaviais transgressivos? São aqueles que alcançam altas produtividades por superarem os limites impostos por fatores como estresse hídrico, pragas e doenças. No pacote tecnológico que pavimenta a trajetória rumo a casos de sucesso estão incluídos agricultura de precisão, proteção ao canavial e ambiente ideal para a planta. Essas são algumas das recomendações do Instituto Agronômico (IAC), da Secretaria de Agricultura e Abastecimento do Estado de São Paulo. As metas para o setor sucroenergético são a produtividade agrícola de três dígitos na média dos cinco primeiros cortes, ou seja, acima de 100 a 120 toneladas, por hectare, com produção acima de 8.800 litros a 10.560 litros de etanol, por hectare.

“Nosso objetivo é chamar a atenção para o potencial da cana-de-açúcar e mostrar que a produtividade pode ser muito acima do que vem sendo obtido, queremos causar uma provocação junto às unidades que ainda não alcançam a produtividade de três dígitos”, conta Marcos Guimarães de Andrade Landell, pesquisador do Instituto Agronômico (IAC), da Secretaria de Agricultura e Abastecimento do Estado de São Paulo. Essa “provocação” foi feita em diversas palestras online realizadas por Landell ao longo da pandemia. 

Para identificar casos de sucesso, o pesquisador consultou vários produtores que têm alta produtividade e perguntou sobre a adoção de tecnologias IAC, como o Terceiro Eixo, e outras ações fitotécnicas que têm aumentado o desempenho da lavoura. Esses canavicultores informaram sobre a produtividade obtida e também sobre o ciclo das variedades, se é precoce, médio ou tardio, e as tecnologias adotadas.  

Para ampliar a produtividade, recomenda-se como estratégia o aumento da população de colmos do canavial, hoje normalmente composta por 60-80 a 110 mil colmos, por hectare, para populações de 80-100 mil colmos, por hectare. Produtividades maiores redundarão em maior longevidade dos canaviais, com média de 8 a 10 cortes.

Para romper com os baixos resultados, o programa Cana IAC recomenda proporcionar a ambiência nos canaviais. Essa condição inclui nutrição mineral mais arrojada, irrigação complementar ou plena, adoção de tecnologias que estimulem o crescimento do sistema radicular ou que sejam indutoras de estratégias que levem ao aumento da produtividade. Recomenda-se também a redução do pisoteio com uso de tecnologias de agricultura de precisão, tecnologias de proteção, uso de maturadores e outros produtos de ação fisiológica, além de incorporação de novas variedades e manejo varietal. 

“Estamos falando de recursos como uso de GPS, imagens feitas por drones e sensores que indicam a posição geográfica da linha de cana e auxiliam para que as atividades sejam realizadas sem que a máquina pisoteie a linha”, explica. O pesquisador alerta que esses cuidados beneficiam tanto as plantas que estão atualmente no canavial como aquelas do ciclo posterior. No passado, o produtor de cana tinha uma visualização difícil da linha porque não havia esses recursos da agricultura de precisão.

Há vários fatores que reduzem a produtividade como, por exemplo, o déficit hídrico e as pragas e doenças.  O correto é fazer um diagnóstico para suprimir esses elementos que afetam negativamente a produtividade.  O entorno da cana deve ter um ambiente propício para que a planta alcance o seu melhor desempenho.  Se a cana estiver em plena condição, ela pode alcançar as 350 toneladas, por hectare. 

“No Centro de Cana do IAC, em Ribeirão Preto, já foi alcançado esse resultado porque minimizamos todas as restrições durante os 12 meses de desenvolvimento da planta”, afirma. As restrições suprimidas foram a seca e qualquer ação de pragas e doenças que foram controladas com uso de fungicidas e inseticidas. Além desses cuidados, foi adotado um “pacote nutricional robusto”, fornecendo condição de elevada resposta em variedades de alto potencial biológico.  “Tirar esses obstáculos é proteger a sua cana, é o que chamamos de ambiência, isto é, a melhor condição possível para a expressão de uma planta”, resume.

Plantio falha zero

Para atingir os três dígitos, é fundamental ter uma boa população de colmos, que está relacionada com a inexistência de falhas na instalação do canavial, também chamado plantio falha zero. “Os três dígitos são atingidos com maior eficácia quando estabelecemos ações técnicas na fundação do canavial, com bom preparo de solo, incorporando corretivos, nutrientes e matéria orgânica no perfil do solo, assim como estabelecer ações de proteção a doenças e pragas e também ao déficit hídrico pronunciado”, recomenda o pesquisador do IAC, da Agência Paulista de Tecnologia dos Agronegócios (APTA). 

A estratégia de usar como indicador a população de colmos pode se tornar importante aliada para atingir elevadas produtividades e começa pelo plantio falha zero. Isto é, é necessário adotar cuidados para que não haja falhas na brotação do canavial.

Em busca do plantio falha zero, pode-se lançar mão da adoção do sistema de Mudas Pré-Brotadas (MPB), que viabiliza melhor organização espacial do canavial. “Com MPB, precisamos de apenas uma touceira (MPB) a cada 60-70 cm para atingir produtividades muito expressivas. Comparado ao sistema convencional de plantação de “toletes”, o qual chega a utilizar até mais de 20 gemas para cada metro de sulco, é uma diferença significativa”, explica Landell. Nesse caso, é imprevisível o número de touceiras que se estabelecem a cada metro de sulco, ocasionando uma grande desorganização espacial de todo o canavial. Além dessa incerteza, o fato de haver um grande número de touceiras é prejudicial porque gera competição por recursos, como água, nutrientes e luz. 

            Outra recomendação rumo à alta produtividade é a adoção do manejo do Terceiro Eixo em substituição ao manejo da curva de maturação. Atualmente, prevalece nas unidades produtoras de cana o manejo de colheita guiado pela época da maturação da planta. Porém, há canas com ciclo precoce, médio ou tardio. “Esse arranjo foi feito há décadas, inspirado em outros países, como a Austrália, que tem temperaturas mais baixas que o Brasil e a indução da maturação da cana é dada pelo frio.  No Brasil não tem frio, aqui é o déficit hídrico que faz a cana acumular sacarose”, esclarece. 

O Terceiro Eixo foi desenvolvido pelo IAC como estratégia para reduzir a exposição da cana ao déficit hídrico.  Landell explica que a mesma seca que promove a produtividade da cana também reduz a produção de biomassa.  Além disso, o ciclo da cana do primeiro ao quinto corte tem relação direta com o volume do sistema radicular. “Isso significa que quanto mais velha for a cana, mais as raízes serão profundas e alcançarão mais água; a cana mais velha se protege mais do déficit hídrico”, complementa.  

A proposta do Terceiro Eixo inverte esse manejo pois recomenda iniciar a colheita, em maio-junho, pelo canavial novo, para evitar que a planta passe sede, e mantém as plantas mais velhas, aptas para explorarem o déficit hídrico, para serem colhidas a partir de agosto. “Esse conceito é melhor do que a referência do ciclo precoce, médio e tardio; o Terceiro Eixo veio substituir o modelo adotado de acordo com a curva de maturação”, explica. 

O uso de variedades eretas é outra recomendação com vistas à produtividade elevada. Esse porte contribui para reduzir as impurezas vegetais e minerais na cana colhida. A cana ereta chega mais limpa ao processamento. A tombada chega suja de restos vegetais e de solo, contaminada por impureza mineral.  “Com isso a qualidade da matéria-prima fica prejudicada, a impureza interfere no processo de moagem e fabricação de açúcar e etanol, reduzindo a qualidade da cana em termos de sacarose”, afirma.  

Isso ocorre porque, para o melhor funcionamento da colhedeira, o ideal é que a planta seja ereta. A máquina corta no alto da cana, no chamado ponteiro, e também embaixo, próximo ao solo. Na sequência, a cana entra no canal de recolhimento da máquina, onde ela é cortada em partes de 40 cm.  Nesse processo, a palha fica no campo, na área da colheita.  “Porém, se a cana estiver tombada, a máquina não consegue retirar seu ponteiro, então fica uma quantidade de restos de cana que prejudicam o sistema”, explica. 

Assessoria de Comunicação
Secretaria de Agricultura e Abastecimento do Estado de São Paulo