“Se não houver quebra violenta de ATR, não é Colletotrichum”
26-09-2025

Professor Dr. Modesto Barreto detalhou sintomas, gatilhos e prejuízos econômicos de doenças
Por Andréia Vital
O professor Dr. Modesto Barreto, da Universidade Estadual Paulista (Unesp), fez um alerta importante durante o lançamento da Plataforma Esfera, no Centro de Tecnologia Canavieira (CTC), em Piracicaba - SP, na última terça-feira (23). Durante sua fala, ele destacou o crescente impacto de dois patógenos até então considerados secundários: o Fusarium e o Colletotrichum, que têm se mostrado ameaças significativas para a produtividade da cana-de-açúcar.
De acordo com Barreto, esses fungos já estão presentes em praticamente todas as regiões canavieiras e se manifestam com mais intensidade em épocas de chuvas ou em condições de estresse para a planta, como a seca prolongada ou o ataque da broca-da-cana (Diatraea saccharalis). A presença desses fatores facilita o desenvolvimento dos patógenos, resultando em perdas tanto na quantidade de cana colhida quanto na qualidade da matéria-prima.
Barreto relatou os resultados de um estudo de dois anos, realizado com isolamentos a cada 15 dias, que demonstrou que, em 99,12% das amostras, o Fusarium estava presente na planta hospedeira. "O Fusarium está dentro da planta, mas precisa de um gatilho para se manifestar. Esse gatilho pode ser uma seca prolongada, ataque de pragas ou até mesmo uma deficiência de boro", explicou o especialista.
Entre os principais sintomas do Fusarium estão o Pokkah Boeng (ou podridão do colmo), o enfraquecimento das gemas, falhas na brotação e a podridão da inflorescência. A deficiência de boro agrava o quadro, pois danifica células do sistema vascular, criando um ambiente propício para o avanço do patógeno.
Segundo o professor, uma das maiores dificuldades em quantificar os prejuízos é a presença simultânea de outros agentes patogênicos, como o Colletotrichum, o que torna difícil separar as causas e avaliar os impactos de maneira precisa. No entanto, ele ressaltou que o Fusarium compromete a germinação, o vigor das mudas e a produtividade, o que afeta diretamente a rentabilidade da cultura.
Barreto alertou que o Fusarium não deve ser tratado como um problema secundário. "Ele se aproveita de qualquer fragilidade da planta, por isso a atenção deve ser contínua", afirmou. O fungo não forma estruturas de resistência clássicas, mas sobrevive em sementes, mudas e em diversas outras plantas, como milho, sorgo, trigo e abacaxi, o que amplia o risco de disseminação.
Colletotrichum: o fungo que virou uma ameaça primária
O Colletotrichum falcatum, conhecido por causar a podridão vermelha e identificado como o agente primário da Síndrome da Murcha, ganhou relevância apenas nos últimos anos. Barreto compartilhou sua experiência, explicando que, quando defendeu sua tese sobre o tema entre 1981 e 1985, o problema ainda era considerado irrelevante. "Foi apenas a partir de 2011/12 que o Colletotrichum se tornou um problema sério. Quando me aposentei em 2014, já era uma praga importante", afirmou o especialista.
Os sintomas do Colletotrichum incluem lesões vermelhas na nervura central das folhas, clareamento das lesões com pontos pretos e rachaduras no colmo, que enfraquecem a planta. O fungo se aproveita de ferimentos causados pela broca para entrar no sistema vascular da planta, provocando apodrecimento interno e a formação de faixas brancas, que indicam maior suscetibilidade da variedade.
A perda econômica causada pelo fungo pode ser significativa. Barreto citou estudos que indicam uma queda no ATR (Açúcar Total Recuperável) de 50% a 70% em áreas infectadas. "Essa é a assinatura da doença: se não houver uma quebra violenta de ATR, não é Colletotrichum", enfatizou.
O especialista também destacou que, embora não haja como controlar completamente os patógenos, é possível controlar os gatilhos e usar variedades resistentes como forma de manejo. No entanto, ele alertou que não há mais testes regulares como aconteciam no passado, e que isso precisa ser retomado com urgência para enfrentar as ameaças que esses fungos representam para a produtividade da cana-de-açúcar.