"The Guardian" é o primeiro jornal a recusar anúncio de empresas de combustíveis fósseis
03-02-2020

O jornal britânico "The Guardian" é o primeiro grande veículo de imprensa internacional a anunciar que não aceitará mais anúncios pagos por empresas de combustíveis fósseis.

O anúncio, feito na quarta-feira, torna a empresa a primeira grande organização noticiosa a tomar a decisão de se afastar dos investimentos das maiores fontes de emissão de gases-estufa.

Em 2019 o "Guardian" atualizou seu manual de redação e adotou o termo "emergência climática" para dar a real dimensão e a urgência de se enfrentar a mudança do clima.

O anúncio de rejeitar estes anúncios foi feito em nota conjunta pela diretora executiva interina Anna Bateson e pela diretora de finanças Hamish Nicklin.

As diretoras lembraram que o aquecimento global é "o desafio mais importante dos nossos tempos" e destacaram as notícias produzidas pelo jornal sobre como o lobby de empresas de energia prejudica os avanços globais nesta agenda.

Ambientalistas têm dito que as empresas de petróleo, carvão e gás gastam em propaganda para divulgar investimentos modestos em energias renováveis enquanto continuam a colocar grandes aportes de recursos na extração de fósseis.

Em janeiro, a ativista sueca Greta Thunberg criticou jornais que aceitam anúncios de empresas ligadas ao setor de combustíveis fósseis.

Ela disse que conhecia apenas o caso do jornal sueco "Dagens ETC", que se recusava a aceitar este tipo de publicidade desde setembro. "Qual será o primeiro grande jornal internacional a ter a liderança nisso?", questionou Greta.

A empresa que publica o "Guardian" e "The Independent" tem o compromisso institucional de neutralizar todas as suas emissões de carbono em 2030.

As diretoras reconhecem que o anúncio é um golpe para o modelo de negócios do "Guardian". Os jornais, de modo geral, vem enfrentando dificuldades nos últimos anos.

Elas reconheceram que a decisão "pode tornar nossas vidas um pouco mais difíceis no curto prazo". Disseram, ainda, que alguns leitores gostariam que a decisão englobasse também os anúncios de carros e férias, mas que "a interrupção destes anúncios seria um duro golpe financeiro e pode nos forçar a fazer cortes significativos no jornalismo".

As diretoras esperam que os leitores continuem a apoiar o jornalismo do "Guardian" e que a decisão abra caminho para novas empresas anunciarem no jornal. Lembraram que a publicidade continuará a ser fonte importante de financiamento dos jornais.

"O futuro da publicidade está em criar confiança com os consumidores e demonstrar compromisso real de valores e propósitos", diz a nota.

A iniciativa ecoa em um movimento crescente de desinvestimento em combustíveis fósseis e que vem atraindo fundos de pensão e de investimentos, universidades e grupos religiosos na Europa e nos Estados Unidos.

A tendência de desinvestimento em combustíveis fósseis também foi um dos pilares de discussão da edição deste ano do Fórum Econômico Mundial, há poucos dias, em Davos, na Suíça.

 

Daniela Chiaretti
Fonte: Valor Econômico