Brasil visa salto nas exportações de DDGs com demanda chinesa
01-12-2025
Com produção em alta e habilitação de plantas para vender à China, Brasil passa a disputar um mercado até então dominado pelos EUA
Por Sabrina Nascimento | São Paulo
Neste ano, o Brasil entrou em uma corrida que promete redefinir fluxos globais. Pela primeira vez, passa a disputar com os Estados Unidos um mercado que, até pouco tempo atrás, parecia consolidado.
Durante anos, o comércio internacional de DDG e DDGS — coprodutos do processamento de etanol de milho, usados em rações animais — foi um território dominado quase exclusivamente pelos norte-americanos. A concentração era tão grande que, só em 2024, a China importou 99,6% de tudo o que consumiu diretamente dos EUA, movimentando cerca de US$ 65 milhões na compra desses insumos.
O Brasil decidiu entrar nesse jogo, que promete, a partir de 2026, impulsionar as exportações do setor. “Existe um apetite enorme das grandes companhias chinesas para comprar volumes expressivos do DDGs brasileiros”, afirma Guilherme Nolasco, presidente da União Nacional do Etanol de Milho (Unem).
Ao Agro Estadão, Nolasco salientou que, desde maio — quando o governo de Pequim autorizou a abertura do mercado chinês para os DDGs do Brasil —, delegações estatais e de empresas privadas da China têm vindo ao País visitar as unidades produtoras dos coprodutos.
No início de novembro, houve a homologação das primeiras cinco indústrias brasileiras para exportação à China. “Acredito que devem os primeiros embarques ocorrer a partir do início de 2026”, disse o dirigente da Unem. Além das unidades já autorizadas, outras onze plantas aguardam análise da Administração Geral das Alfândegas chinesas.
Etanol impulsiona DDGs
O interesse chinês no DDGs brasileiro coincide com o avanço da indústria de etanol de milho no País. O centro dessa transformação está em Mato Grosso, onde a Companhia Nacional de Abastecimento prevê uma colheita de 54,2 milhões de toneladas de milho na safra 2025/26.
A oferta robusta de grãos sustenta tanto a produção de etanol quanto a de coprodutos utilizados na nutrição animal. No mercado interno, o DDG é disputado por bovinocultura, suinocultura e avicultura, que absorvem a maior parte da oferta.
Mas a demanda brasileira encontra limites. Segundo a Scot Consultoria, as cotações do DDG giraram entre R$ 1.130 e R$ 1.173 por tonelada nos estados centrais, enquanto a oferta no mercado spot encolheu — vendedores cumprem contratos antigos e novas entregas só são negociadas para janeiro em diante. O cenário reforça a avaliação de que parte do crescimento deve vir das exportações.
Inclusive, dados compilados pela Scot Consultoria mostram embarques em ascensão. No acumulado deste ano, até outubro, o Brasil exportou 714,9 mil toneladas de DDG e DDGS — o maior volume já registrado para o período. O desempenho consolida uma curva de crescimento: em 2019, os embarques eram praticamente residuais. Porém, em sete anos, a exportação do coproduto avançou 15,9 vezes — e a tendência é de novo recorde em 2025, projeta a consultoria.
Os números mostram também que Turquia (34,7%), Vietnã (28,7%), Nova Zelândia (13,9%) e Espanha (12,2%) lideraram as compras até outubro.
Por que a China quer DDG?
Para entender o movimento chinês, é preciso olhar para a matriz alimentar do país asiático. Como maior produtora e consumidora de carne suína do planeta, a China depende de um fluxo gigantesco e constante de ração. Milho e farelo de soja são os pilares desse sistema, mas também representam vulnerabilidades: volatilidade de preços, pressões geopolíticas e a alta dependência de fornecedores externos.
Nesse contexto, o DDG oferece um caminho alternativo por oferecer diversificação da formulação de rações, sem perda de proteína. O uso como nutrição animal vai além dos suínos. Pode ser oferecido igualmente para aves e bovinos, garantindo uma eficiência nutricional.
Por isso, em relatório recente, o Insper Agro Global avaliou que a abertura do mercado chinês ao DDG brasileiro “é menos um gesto de boa vontade e mais parte de uma política ativa de reorganização das cadeias de insumo”. Segundo a instituição, a ação da China busca reduzir riscos geopolíticos e diversificar fornecedores.
O tamanho da oportunidade
Embora os 7 milhões de toneladas demandadas anualmente pela China superem toda a produção brasileira prevista para este ano, estimada em cerca de 5,5 milhões de toneladas, segundo a Unem, o setor trabalha com metas graduais.
A entidade estima que entre 20% e 35% da produção nacional poderá ser destinada ao mercado internacional no médio prazo — sem comprometer a oferta doméstica. “Nosso grande mercado continuará sendo o interno”, ressalta Nolasco, destacando que a demanda chinesa deve, sim, ampliar o total das exportações do setor.
Ao mesmo passo, internamente, o Brasil também projeta crescer. De acordo com o Instituto Mato-grossense de Economia Agropecuária (Imea), a produção nacional de DDG/DDGS pode alcançar 6 milhões de toneladas até a safra 2030/2031.
Para transformar esse potencial em vantagem competitiva, entretanto, o Insper Agro Global avalia que será preciso avançar além da capacidade industrial. “Para que o DDG/DDGS nacional se firme como player competitivo globalmente, será necessário ir além da produção: investir em logística, certificações, inteligência comercial e diálogo institucional com mercados estratégicos”, indica o relatório.
Fonte: Estadão

