Mais de 6 milhões de mulheres movem a economia rural no Brasil
15-10-2025

Influência feminina cresce de forma contínua desde meados dos anos 2000 e consolida novas lideranças nas atividades rurais do País
Entre o manejo da terra, a administração familiar e o empreendedorismo, as mulheres do campo se tornaram agentes decisivas para a segurança alimentar e o desenvolvimento econômico do Brasil. Tanto que, há 30 anos, ganharam, da Assembleia Geral das Nações Unidas, uma data dedicada a elas. Desde 1995, 15 de outubro marca o Dia Internacional da Mulher Rural.
De acordo com a Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação (FAO), as mulheres rurais são peças-chave para o desenvolvimento sustentável. Na América Latina, porém, ainda enfrentam desigualdades significativas. O relatório mais recente da instituição aponta que a região apresenta a maior diferença mundial de insegurança alimentar entre homens e mulheres, com 5,2 pontos percentuais de distância — um alerta sobre a necessidade de ampliar políticas que garantam acesso a crédito, tecnologia e capacitação para trabalhadoras rurais.
No Brasil, conforme o último Censo Agropecuário, realizado em 2017, elas somavam 6,1 milhões: 4,37 milhões atuavam como trabalhadoras rurais, 946 mil dirigiam estabelecimentos rurais e 817 mil participavam como codiretoras.
Levantamento do Observatório das Mulheres Rurais da Embrapa mostra que a presença feminina na produção de alimentos vem crescendo de forma contínua desde meados dos anos 2000. O avanço reflete a ampliação de políticas públicas voltadas à igualdade de gênero no campo e o fortalecimento da autonomia econômica das agricultoras. Esse movimento contribuiu para consolidar novas lideranças femininas em comunidades rurais e impulsionar o empreendedorismo em pequenas e médias propriedades.
Liderança regional e presença em todo o país
A Bahia é o Estado com o maior número de agricultoras familiares — quase 160 mil mulheres — seguido por Minas Gerais, Pernambuco e Ceará. Também se destacam, no Norte e no Nordeste, Pará, Piauí, Maranhão e Paraíba. Nas regiões Sul e Sudeste, o protagonismo feminino é crescente em estados como Rio Grande do Sul, Paraná, São Paulo e Goiás.
Mesmo nas unidades federativas com participação menor, como Amapá e Distrito Federal, observa-se avanço gradual na presença feminina. O conjunto dos dados aponta para uma tendência nacional de fortalecimento das mulheres como força produtiva e de gestão no campo.
De acordo com André Marchetti, agrônomo e consultor técnico da Cactvs, instituição que atua com microcrédito e inclusão produtiva em áreas rurais, quando a mulher tem acesso a recursos e autonomia financeira, toda a comunidade se transforma, em um efeito multiplicador de desenvolvimento.
Renda, autonomia e protagonismo
As estatísticas confirmam que as mulheres são cada vez mais centrais na economia rural. Segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), elas respondem por 42,4% da renda familiar no campo, índice que chega a 51% no Nordeste. O Censo Demográfico de 2022 reforça essa transformação: quase metade dos lares brasileiros (49,1%) passou a ser chefiada por mulheres. No meio rural, o percentual é de 24,8%, resultado que representa um salto expressivo em relação à década anterior.
“As mulheres não são coadjuvantes no agro — elas estão na linha de frente da gestão, da tomada de decisão e da geração de renda. Muitas administram propriedades, coordenam equipes e garantem o sustento de suas famílias com eficiência e sensibilidade”, comenta Marchetti.
Sustentabilidade e inovação conduzidas por elas
O empreendedorismo feminino tem impulsionado a agricultura familiar, responsável por cerca de 70% dos alimentos consumidos no Brasil. Em 2017, 16% dos estabelecimentos familiares já eram comandados por mulheres — proporção que segue em expansão.
Entre 2023 e 2025, o Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA) destinou R$ 68 milhões a programas voltados à produção liderada por mulheres, com 16 mil quintais produtivos implantados ou em implantação. Esses espaços reúnem hortas, pomares, criações de pequeno porte e cultivo de plantas medicinais, sempre com foco em agroecologia e segurança alimentar.
Para Marchetti, as mulheres têm uma visão ampla do território e, por isso, conseguem unir produtividade, preservação e cuidado com as pessoas. Investir nelas é apostar em um agro mais sustentável e inclusivo.
Desafios e futuro
Apesar dos avanços, a desigualdade ainda persiste. Apenas 19% das propriedades rurais estão registradas em nome de mulheres, e o acesso à assistência técnica e a programas de financiamento segue desigual. Superar essas barreiras, na visão de Marchetti, é condição essencial para consolidar o protagonismo feminino e garantir que o desenvolvimento do campo continue caminhando junto com a igualdade de gênero.
“O campo brasileiro tem rosto feminino. Reconhecer isso é essencial para desenhar políticas públicas mais eficazes, que fortaleçam o crédito rural, a educação e a sucessão familiar no campo. O futuro do agro passa, necessariamente, pela mulher”, conclui.
Fonte: Estadão