Na corrida pelos biocombustíveis, CO2 vira produto
01-12-2025
Captura e uso ou armazenamento de CO2 na bioenergia é alternativa que pode levar indústria a emissões negativas
Por Nayara Machado
O compromisso encabeçado pelo Brasil na COP30 de quadruplicar a produção e consumo de combustíveis sustentáveis até 2035 tem potencial de mobilizar bilhões em investimentos e alavancar um novo mercado associado à bioenergia: o do CO2 como produto.
Estudo publicado pela Empresa de Pesquisa Energética (EPE) aponta que o país tem disponível cerca de 27 milhões de toneladas por ano de CO2 apenas no setor de etanol.
No biogás, cuja escala de produção ainda é pequena, o volume fica em 491 mil toneladas ano, sendo 99 mil toneladas/ano nas plantas em operação e o restante nas unidades com pedidos de autorização.
De acordo com o documento (.pdf), as principais oportunidades envolvem a fermentação alcoólica e a purificação do biogás (em termos de facilidade de captura) e a cogeração a biomassa (em termos de volume).
A projeção é que é possível alcançar 197 Mt de CO2 biogênico em 2035 no setor de etanol, a maior parte (155 MtCO2) vindo de cogeração. As usinas de etanol de cana e milho podem contribuir com 36 MtCO2 e o biometano com mais 6 MtCO2.
A captura e uso ou armazenamento de CO2 na bioenergia é uma alternativa para reduzir e até levar a indústria a emissões negativas.
Um potencial que o Brasil pode explorar para atingir a neutralidade até 2050, e amenizar os impactos de setores que terão maior dificuldade para redução de emissões.
A diretora de Estudos do Petróleo, Gás e Biocombustíveis da EPE, Heloísa Borges, explica que o aumento acelerado da produção de biocombustíveis fará crescer de forma expressiva o volume de emissões de CO2 biogênico – o que pode ajudar a impulsionar a produção de combustíveis sintéticos e a descarbonização da indústria.
“Quando olhamos a rampa de subida da produção de biocombustíveis, há um crescimento grande de CO2 associado à fermentação da indústria sucroalcooleira e à purificação do biogás. Nós podemos usar esse CO2. É um subproduto que pode e deve ser comercializado”, disse em entrevista à eixos na COP30, em Belém, às vésperas da publicação do estudo.
O trabalho da EPE aponta que o CO2 biogênico pode viabilizar rotas como e-metanol e e-amônia, que dependem de carbono para sintetizar combustíveis limpos.
Segundo Borges, como o uso de carbono fóssil nessas cadeias compromete a descarbonização, a tendência é de valorização da oferta renovável.
Oportunidade no mercado de carbono
Políticas públicas como o RenovaBio, Combustível do Futuro e Programa de Aceleração da Transição Energética (Paten) já trazem alguns mecanismos de fomento ao aproveitamento do CO2.
No RenovaBio, por exemplo, há um bônus de até 20% na nota de eficiência energético-ambiental do produtor ou importador de biocombustível que comprove emissões negativas de gases de efeito estufa.
Mas a EPE também aponta que o desenvolvimento em escala de atividades de captura, transporte, uso e armazenamento de CO2 (CCUS) no Brasil ainda depende de uma série de definições regulatórias e incentivos.
Uma das fronteiras é justamente o mercado de carbono, em fase de regulamentação.
O relatório aponta que a lei 15.042/2024, que instituiu o Sistema Brasileiro de Comércio de Emissões de Gases de Efeito Estufa, pode ser um mecanismo decisivo para o CCUS no Brasil.
“Entretanto, ainda é necessário definir as regulações específicas para início de operação desse mercado”, observa o documento.
Do combustível à água com gás
A indústria está atenta a esse novo momento do carbono. Nesta sexta (28), a produtora de biocombustíveis Be8 anunciou a assinatura de uma carta de intenções com a Air Liquide para comercialização de CO2 biogênico capturado da produção de etanol.
A parceria estabelece o fornecimento do gás a partir de uma usina em Passo Fundo (RS) prevista para entrar em operação no segundo semestre de 2026. Segundo o presidente da Be8, Erasmo Carlos Battistella, com a captura do CO2, o projeto completará o ciclo integral de valorização da matéria-prima.
Ao mesmo tempo, atenderá demandas de diversos setores industriais que buscam alternativas sustentáveis para sua produção.
Para o diretor geral da Air Liquide Brasil, Rodrigo Jorge, o projeto é estratégico na garantia de cadeias de suprimentos resilientes.
O gás será purificado pela Air Liquide em padrões de alta exigência e destinado a setores como hospitais (gases medicinais e terapêuticos), indústria de bebidas (carbonatação), setor metalmecânico (soldagem e resfriamento), refrigeração e controle ambiental, agricultura e hortifruti (ambientes de estufa), entre outras aplicações industriais.
Fonte: Agência Eixos

