Por que chegamos onde chegamos?
03-11-2025

A semana encerrou com mais uma rodada de quedas expressivas em Nova York, com o vencimento março/26 fechando a 14.42 centavos de dólar por libra-peso, acumulando retração de 55 pontos, o que equivale a pouco mais de 12 dólares por tonelada.

Por Arnaldo Luiz Corrêa

Os contratos da safra 2026/27, ou seja, de maio/26 a março/27, também recuaram entre 25 e 46 pontos, algo entre 5.50 e 10 dólares por tonelada, refletindo um ambiente ainda contaminado pelo pessimismo que tomou conta do mercado após a chamada “semana do açúcar” no Brasil. Como costuma ocorrer em commodities, o sentimento coletivo segue amplificando os extremos: baixistas na baixa e eufóricos na alta. A realidade, porém, é que o mercado ainda processa o excesso de negatividade acumulado nas últimas semanas.

Os números divulgados pela UNICA não trouxeram surpresas. A moagem acumulada atingiu 525 milhões de toneladas de cana, restando cerca de 70 milhões para alcançar as 595 milhões de toneladas estimadas para o final da safra. Nos últimos cinco anos, a média de moagem no mesmo período (de novembro a março) foi de 80,5 milhões de toneladas; excluindo a excepcional safra 2023/24, o número fica em 70,5 milhões, o que reforça a expectativa de que o Centro-Sul deve atingir a meta projetada.

O destaque vem do ATR, que se recuperou de forma impressionante — 158.78 kg/t na quinzena e 137.53 kg/t no acumulado. Mantendo-se uma ATR média de 136.27 kg/t e um mix açucareiro de 52.36%, a produção projetada chega a 40.5 milhões de toneladas, em linha com as estimativas de mercado. Entretanto, se houver aumento da produção de etanol em março, o mix pode cair para 52%, levando a produção de açúcar para cerca de 40 milhões de toneladas.

A pergunta que ecoa entre as usinas é simples, mas difícil de responder: por que o mercado desabou tanto? Há dois anos, durante a semana do açúcar de 2023, o contrato de Nova York negociava a 28 centavos, e o etanol na B3 operava com 800 pontos de desconto em relação à NY. Hoje, o açúcar vale metade disso e o etanol exibe 200 pontos de prêmio — um espelho invertido que deixa evidente que a distorção antes e agora está em Nova York.

Entre os fatores que explicam a derrocada estão a rolagem excessiva de posições das usinas, que transferiram vendas de maio para julho, de julho para outubro e de outubro para março, empurrando para frente cerca de 3 milhões de toneladas ainda pendentes de fixação, segundo um trader. Soma-se a isso a agressividade dos fundos especulativos, cuja posição vendida é estimada em 225 mil lotes — equivalente a mais de 11 milhões de toneladas. Descontando o volume das usinas ainda por fixar, restam 165 mil lotes que, em algum momento, precisarão ser recomprados. O problema é a ausência de gatilhos que justifiquem recompras imediatas. O mercado segue sem um evento claro que provoque reversão de tendência, mas a história mostra que os fundos raramente mantêm posições vendidas em mercados invertidos — o que sugere que a liquidação pode vir antes do fim de dezembro.

Outro fator que pressiona os preços é o abastecimento global confortável. O Brasil exportou 33.3 milhões de toneladas de açúcar nos últimos 12 meses até setembro de 2025, volume 13% menor que o do ano anterior, mas ainda robusto. Em quatro anos, o país embarcou mais de 127 milhões de toneladas, uma média de 31,8 milhões por ano, o que indica crescimento de 6% no market share brasileiro no período — prova de que o país segue sendo o fornecedor mais confiável do mundo.

As projeções para a próxima safra reforçam esse conforto, com estimativas entre 620 e 640 milhões de toneladas de cana no Centro-Sul. Embora prematuras, essas expectativas pressionam o mercado, especialmente diante de sinais positivos na Índia, onde as chuvas atrasaram o início da safra, mas não devem comprometer a produção. Há ainda o temor de negociações com os Estados Unidos envolvendo o etanol, o que poderia abrir espaço para a entrada do produto americano no Brasil caso a taxação fosse suspensa — um risco adicional para o equilíbrio do mercado doméstico.

O sentimento predominante é de que as más notícias já estão no preço. Falta agora um motivo para o mercado respirar — e talvez esse motivo venha do fim do shutdown americano e da consequente divulgação da posição dos fundos pelo CFTC. Caso o relatório revele uma posição acima de 210 mil contratos vendidos, isso exporia uma vulnerabilidade significativa dos fundos, que teriam dificuldade em encontrar contraparte para recomprar seus lotes num mercado cada vez menos líquido. Até lá, o mercado segue em compasso de espera. O jogo continua aberto, mas neste momento, a palavra-chave é paciência.

Uma história saborosa contada pelo Luiz Silvestre, Chief Trader da Sucden, no podcast que levamos ao ar na semana passada pela Archer Education em parceria com o Jornal da Orla (que você pode acessar aqui è https://youtu.be/MShVZzBUJ3o?si=jDnC1LD-3335xfJN ): “ouvi recentemente um professor iniciar sua aula com uma pergunta simples: “O que é commodity para vocês?” — e, claro, vieram as respostas previsíveis: produto padronizado, negociado globalmente, mesma especificação em qualquer canto do planeta. Ele deixou o pessoal falar uns cinco minutos e, então, soltou a pérola: “Nada disso. Commodity é um produto cujo preço é dado pelo mercado.” E continuou, “Se você fabrica canecas, o preço será custo mais margem = preço. Mas, se você produz açúcar, café ou petróleo, o preço já está lá na tela todo santo dia — e a conta se inverte: preço menos custo = margem”. Em outras palavras, quem trabalha com commodities não ganha no preço, ganha na eficiência. A margem não está no mercado, está na gestão. E talvez essa seja a definição mais simples — e mais verdadeira — que eu já ouvi em quase quatro décadas nesse ramo”. Brilhante.

Nosso colaborador Marcelo Moreira aponta que o vencimento março-26, após negociar na mínima dos últimos 3 anos - na quinta-feira a 14.07 centavos de dólar por libra-peso- conseguiu uma rápida recuperação e encerrou a semana a 14.42 centavos de dólar por libra-peso. O patamar psicológico dos 14.00 centavos de dólar por libra-peso foi rompido em todos os demais vencimentos maio-julho-outubro-26 (negociaram nas mínimas da semana respectivamente a 13.77, 13.72 e 13.95 centavos de dólar por libra-peso). No curto prazo, o indicador “estocástico” encerrou a semana em reversão, indicando “compra”. Agora o vencimento março-26 encontra suporte nos 14.00 centavos de dólar por libra-peso e resistências a 14.57, 14.73, 15.08, 16.09, 16.58 e finalmente 17.51 centavos de dólar por libra-peso.

Fonte: Archer Consulting